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Os resultados das eleições em primeiro turno revelaram duas tendências contraditórias que vêm caracterizando as motivações do eleitorado brasileiro nas últimas eleições. De um lado, muitos candidatos que estão sendo processados pela Justiça ou foram citados em investigações recentes foram rejeitados pelos eleitores. De outro, figuras políticas que mereceriam o mesmo destino foram aclamadas pelas urnas e retornam à vida pública gozando das prerrogativas e privilégios do cargo que exercerão a partir do próximo ano. Assim, clamamos por mais ética na vida política em particular e na vida prática em geral. Cobramos um comportamento responsável social e ambientalmente das organizações públicas e privadas. Manifestamos publicamente nossa indignação com relação às práticas de corrupção ativa e passiva que assolam o Estado brasileiro. Porém, ao mesmo tempo, elegemos sujeitos notoriamente envolvidos nessas práticas. E não podemos afirmar que tais indivíduos são provenientes apenas de estados cuja população encontra-se mais fragilizada pela pobreza e pela miséria, pois os exemplos desses candidatos eleitos podem ser encontrados em estados como São Paulo e Alagoas. Não é, portanto, a fragilidade econômica de determinados segmentos do eleitorado brasileiro que explicaria a eleição de candidatos envolvidos em investigações das instituições responsáveis (como o Ministério Público e a Polícia Federal), mas as tendências contraditórias mencionadas acima.

Essas mesmas tendências explicariam a aparente ineficácia eleitoral de estratégias de campanha que privilegiam o questionamento ético dos candidatos. Os eleitores, de fato, clamam por mais ética na vida política. Esperam de seus candidatos que incorporem valores como a honestidade, a transparência e o espírito público em suas práticas. Mas, ao que parece, não é a ética o componente fundamental que decidirá a eleição no segundo turno. A percepção dos eleitores sobre o primeiro debate realizado na televisão entre os dois candidatos que passaram para o segundo turno mostra que as questões éticas deverão ter um peso menos significativo na decisão dos eleitores. Essa percepção foi avaliada por pesquisas publicadas logo após o debate.

É certo que as motivações dos eleitores são variadas e complexas. É certo, também, que resta algum tempo de campanha e é preciso averiguar o impacto do debate nas intenções de voto. Porém, os números recentes das pesquisas mostram que os dois candidatos consolidaram suas posições junto a faixas distintas do eleitorado. Enquanto um deles obtém ampla vantagem entre os eleitores que recebem até dois salários mínimos, o outro candidato consolidou ligeira vantagem entre eleitores de maior renda e escolaridade. Essa interessante polarização entre os segmentos de renda do eleitorado mostra que a decisão dependerá de motivações de natureza econômica. Em outros termos, dependerá do modo como cada segmento do eleitorado brasileiro avalia o papel e a atuação do Estado, sobretudo no que diz respeito à sua situação econômica.

Enfim, no dia 29 de outubro, os eleitores devem estar atentos às propostas de cada candidato. As questões éticas contam e devem contar, evidentemente. É preciso avaliar os candidatos com base em suas propostas e práticas políticas. Por isso, a fiscalização dos eleitos após o pleito também será fundamental. No distante século 18, Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) alertava para a tendência dos representantes se distanciarem do povo, passando a atuar em nome de seus próprios interesses em detrimento do interesse público. A lição de Rousseau também serve de reflexão na hora da escolha dos candidatos. E os próximos quatro anos mostrarão a qualidade da nossa escolha.

Alexsandro Eugenio Pereira é cientista político, mestre e doutor em Ciência Política pela USP e professor do UnicenP – Centro Universitário Positivo.

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