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As torres do World Trade Center em chamas após o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001.
As torres do World Trade Center em chamas após o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001.| Foto: Jason Szenes/EFE/EPA

Em 11 de setembro de 2001, pela manhã, mantive o celular desligado porque estava em aula. Só voltei a ligá-lo por volta do meio dia ao sair do curso. Antes mesmo que eu começasse a retornar as ligações, o telefone tocou. Um jornalista me perguntou: "Quais as suas impressões sobre a guerra que se inicia?". Eu respondi: "Onde? Não sei de nada." Justo eu, que vivo disso, perdi de ver ao vivo o maior acontecimento histórico do - mal iniciado - século 21. Pedi um tempo para me inteirar do assunto e voltei a falar com o jornalista. No dia seguinte, a citação da minha entrevista na reportagem era a seguinte: "Luciana Worms, professora de geopolítica (...) lembra que, quando os Estados Unidos atacaram o Sudão e o Afeganistão, no governo Clinton, houve promessas de revide. 'Um milionário saudita prometeu que haveria ataques à instituições norte-americanas.'". Esse milionário saudita a quem me referi passou a ser o homem mais procurado do mundo: Osama bin Laden.

A carreira belicosa de Osama começou ainda no final dos anos 70. Em 1979, dois acontecimentos deslocaram a atenção do mundo para a Ásia. Em 1.º de fevereiro o aiatolá Rouhollah Khomeini voltou ao Irã, após 15 anos de exílio, e depôs a monarquia pró-Estados Unidos (EUA) do xá Reza Pahlevi - no poder desde 1953. Khomeini foi recebido por uma multidão fervorosa. Em 25 de dezembro, tropas soviéticas invadiram o Afeganistão, com a intenção de manter o domínio sobre o país. A União Soviética (URSS) só se retirou do país 10 anos depois.

Naquele ano de 1979, quem governava os Estados Unidos era Jimmy Carter, do Partido Democrata. Carter se notabilizou por defender os direitos humanos nas relações internacionais - catalisou o mal-estar do pós-guerra do Vietnã. Porém, nos últimos 14 meses do seu mandato, teve de conviver com o cativeiro de 64 diplomatas dos Estados Unidos feitos reféns na embaixada norte-americana em Teerã. Esse episódio, somado aos problemas econômicos enfrentados pelos norte-americanos, garantiram a vitória do republicano Ronald Reagan, nas eleições presidenciais de 1980.

Desde o início do governo Carter quem coordenava as operações da CIA (Central Intelligence Agency) era o republicano George Herbert Walker Bush. Nascido em uma família ligada aos negócios de petróleo, George Bush tinha estreitas relações com um empreiteiro iemenita radicado na Arábia Saudita, Muhammad Bin Laden, morto em um acidente aéreo, em 1968. Nos anos 70, o filho de Bush, também George, manteve os laços de amizade criados pelo pai, associando-se ao filho mais velho de Muhammad, Salem Bin Laden. Quando em 1979 a URSS invadiu o Afeganistão, George pai pediu ao amigo e sócio do filho o nome de alguém confiável que pudesse infiltrar-se nas terras afegãs para ajudar a fortalecer os mujahidines. O nome indicado foi o do irmão mais novo de Salem, Osama.

Nesse momento os discursos de Khomeini retumbavam nos ouvidos de todos os muçulmanos do mundo. Em nome de cerca de 1 bilhão de islâmicos, o aiatolá condenava os Estados Unidos e União Soviética. Eram os "grandes satãs". Israel, aliado norte-americano, seria um representante desse satã no Oriente Médio e também deveria ser eliminado. A partir de então, grupos de inspiração iraniana começaram a proliferar por todos os lugares com a pretensão de combater o mal ocidental.

Durante a guerra dos afegãos contra a URSS, Osama, a princípio, arrecadava fundos para a manutenção dos combates. Depois começou a participar das batalhas e a financiá-las com sua fortuna.

Aparentemente, Osama voltou-se contra seus antigos aliados durante o processo que levou ao fim a URSS. Com a eliminação de um dos satãs, só restaria a ele e à organização criada por ele, Al-Qaeda, a missão de varrer dos "territórios sagrados do islã" (Arábia Saudita e Israel) as influências ocidentais. A crença de que Israel é o grande empecilho para a criação de um Estado Palestino e o maior algoz do povo palestino foram alguns dos argumentos usados por Osama para justificar os atentados de 11 de Setembro.

Desde 1998 havia uma promessa de Osama de promover atentados contra o Ocidente. Esses atentados resultariam em uma explicação mais do que convincente da necessidade da presença militar dos EUA no Iraque, por exemplo.

A morte de Osama bin Laden pode significar um troféu exibido pelos EUA e um passaporte para a reeleição de Barack Obama. Mas está longe de ser a garantia de um estado de paz. Há uma enorme possibilidade de reações em todo o mundo. Depois da revolução iraniana, este é o episódio mais propenso a movimentar os islâmicos em toda parte. E, em meio aos conflitos que têm levado ditadores árabes à deposição, a Arábia Saudita, em especial, deve se preparar para pagar as contas de uma aliança - cada vez mais desconfortável - com os carrascos desse compatriota e possível novo mártir do mundo islâmico.

Luciana Worms, professora de Geopolítica do Curso Dom Bosco, é autora de Brasil século XX - Ao pé da letra da canção popular, Prêmio Jabuti em 2003.

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