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O impacto do aumento da licença-maternidade
| Foto: Jose Torres/Free Images

Em entrevista recente, a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, manifestou-se favoravelmente à ampliação da licença-maternidade para um ano e da licença-paternidade para três meses. Atualmente, a Constituição Federal assegura, em seu 7.º artigo, inciso XVIII, licença remunerada de 120 dias que pode ser gozada pela gestante a partir do último mês de gestação, conforme disposto também no art. 392 da Consolidação das Leis do Trabalho. Já os cinco dias de licença-paternidade estão estabelecidos no §1.º do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Mas o período pode ser maior, se a gestante for funcionária de empresa cadastrada no Programa “Empresa Cidadã” ou for do setor público.

As políticas de licença-maternidade e de proteção ao emprego são importantes para promover a estabilidade de emprego das mães

O Programa “Empresa Cidadã” foi criado a partir da promulgação da Lei 11.770 de 2008 (alterada pela Lei 13.257, de 2016) e estabelece a possibilidade da prorrogação da licença-maternidade para 180 dias e da licença-paternidade para 20 dias mediante concessão de incentivo fiscal para as empresas que aderirem ao programa. A possibilidade de prorrogação também é prevista para os adotantes. As empresas podem, então, deduzir do imposto devido o total da remuneração integral da empregada e do empregado pago nos dias de prorrogação de sua licença-maternidade e de sua licença-paternidade. Para gozar do benefício, tanto o pai como a mãe não podem, no período de prorrogação das licenças, exercer qualquer atividade remunerada, e a criança deverá ser mantida sob os cuidados de ambos. Para o pai há ainda a condição de participar em "programa ou atividade de orientação sobre paternidade responsável", mas o texto não dá detalhes sobre quais seriam esses programas ou atividades. Já o serviço público adotou o entendimento pela concessão automático dos 180 dias e 20 dias, respectivamente, para a mãe e o pai.

As políticas de licença-maternidade e de proteção ao emprego são importantes para promover a estabilidade de emprego das mães. Estudos realizados após a implementação do Programa “Empresa Cidadã” indicaram que a ampliação da licença-maternidade não alterou a retenção de mães no mercado de trabalho ou o nível de seus salários, até cinco anos após o nascimento da criança. Entretanto, o maior percentual de beneficiárias é pertencente às classes média e alta. As mulheres trabalhadoras de baixa renda em idade fértil normalmente não trabalham em empresas que aderiram ao Programa “Empresa Cidadã”.  Por fim, em termos percentuais, a adesão ao programa se limitou a 34% das empresas (normalmente de médio e grande porte).

A partir de tais informações, pode-se chegar a algumas conclusões com relação ao provável impacto da ampliação da licença-maternidade para um ano, conforme defendido pela ministra Damares. Caso a ampliação ocorra, haverá aumento de custos para as empresas – elas tenderão a fazer a opção pela contratação de homens em detrimento de mulheres em idade fértil. Outra conclusão é a de que haverá um impacto nas contas governamentais, na medida em que o Estado provavelmente será chamado a custear indiretamente parte do salário das trabalhadoras no período adicional de afastamento, como já ocorre atualmente. Em tempos de crise fiscal, dificilmente uma proposta como essa tenderá a prosperar.

Importante destacar que já há no setor privado exemplo de inovação quanto à temática. Algumas empresas têm permitido o gozo da licença parental de forma compartilhada entre mãe e pai. Tal medida, além de permitir que o pai amplie seu contato e vínculo com a criança, permite diminuir a desigualdade flagrante existente com relação à mulher trabalhadora. A Proposta de Emenda à Constituição 16 de 2017 propunha esse compartilhamento, mas foi arquivada ao final de 2018. Fato é que há mulheres que são contrárias à proposta da ampliação da licença, pois estão cientes de que serão, injustamente, ainda mais preteridas do que já o são atualmente. A possibilidade da extensão da licença-maternidade, por absurdo que possa parecer, acaba por penalizá-las.

Como se verifica, não há possibilidade de implementação da licença-maternidade nos moldes propostos pela ministra no curto prazo. No final das contas, o impacto seria negativo justamente para as supostas beneficiadas com relação à empregabilidade e à igualdade de condições no ambiente de trabalho. Convém destacar que o Brasil, diferentemente do que afirmou a ministra, não está “a anos-luz” de outros países no que tange o prazo de licença-maternidade – encontra-se praticamente empatado com a Finlândia, em 15.º lugar, dentre os membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), composta por 36 países. Por fim, o Brasil é um dos 34 países que, em 2018, já cumpria a recomendação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de conceder ao menos 14 semanas de licença-maternidade com remuneração de, no mínimo, dois terços do total de ganhos mensais.

Carlos Ricardo Caichiolo, coordenador da pós-graduação do Ibmec DF.

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