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O poder pode ser comparado a um grande rio. Enquanto se mantém dentro de seus limites é ao mesmo tempo bonito e útil. Mas quando transborda, torna-se impetuoso e perigoso demais para controlar, levando tudo o que encontra no seu caminho e trazendo destruição e desolação aonde quer que vá.

Armando de La Torre fez esse desabafo, inconformado com os rumos tomados pelo Estado na América Latina. Submetido a ditaduras de esquerda ou de direita, nosso continente não escapou de participar da safra mundial de carniceiros. Felizmente, os ditadores sanguinários parecem uma espécie em extinção e deverão ficar relegados aos porões lamentáveis da história.

A sociedade inventou o Estado para se defender de eventos que as pessoas não conseguem vencer isoladamente, tais como: invasão estrangeira, catástrofes climáticas, epidemias e colapso de abastecimento. Mais adiante, o Estado foi chamado a proteger a liberdade, garantir o direito de propriedade e o cumprimento dos contratos juridicamente perfeitos. Somente há pouco mais de um século é que o governo passou a investir em infra-estrutura e em serviços públicos sociais.

Para cumprir as suas funções, o Estado foi autorizado, entre outras tarefas, a organizar forças militares, administrar a moeda e punir os transgressores das leis. Não satisfeito com esse leque de atividades, o governo passou a criar empresas estatais... e aí a coisa degringolou! A onda "estatizante" assumiu vários matizes: o comunismo leninista, com a extinção do direito de propriedade e a eliminação das liberdades; a social-democracia que, embora mantendo o direito de propriedade, fez o Estado se meter em todos os aspectos da vida privada; e o capitalismo intervencionista que, respeitando a propriedade privada e as liberdades, gerou pesada intervenção governamental, seja pela criação de empresas estatais, seja pela regulação das atividades particulares.

O Estado transformou-se em um monstro com várias deformações: corrupto, ineficiente, concentrador de renda, criador de privilégios e gerador de pobreza, o que inspirou Nietzsche a afirmar que o Estado é o "mais frio dos monstros frios". Os governos que lograram compatibilizar eficiência econômica com liberdades individuais foram aqueles que mais se aproximaram da ordem liberal. Ou seja, onde o governo não cedeu à tentação de se tornar um gigante deformado, o país cresceu, conseguindo conciliar prosperidade material com o respeito às liberdades.

Os povos, sobretudo os latino-americanos, enfraquecidos na sua capacidade de prover as condições mínimas para uma vida digna, passaram a ter uma relação ambígua com o monstro frio. Amam-no, ao mesmo tempo em que o odeiam. Sabem-no um pai terrível, mas gostam da sua presença. Ainda não perdemos a esperança de que o governo possa melhorar a distribuição de renda. Todavia, está cada vez mais claro o fracasso do sistema público no cumprimento dessa tarefa, pois os tributos são elevados, e os serviços públicos, precários.

Um grande desafio para a humanidade consiste em: a) como manter o governo confinado às suas funções clássicas, a fim de não exorbitar e invadir os direitos individuais da pessoa humana; e b) como dotar os serviços públicos de um mínimo de ética e produtividade, a fim de impedir que a ineficiência estatal contribua para a perpetuação da pobreza.

Para vencer esses desafios é necessário reinventar o governo. O retrato mais real e cruel do Estado brasileiro é o apagão aéreo. Um país que não consegue cumprir uma tarefa tão elementar quanto o controle do seu espaço aéreo não pode pensar em crescimento. A crise dos controladores de vôo e o caos indecente que se implantou nesse setor mostram como a infra-estrutura brasileira, que está nas mãos do governo, é o maior impedimento para o desenvolvimento do país. É lamentável!

José Pio Martins é professor de Economia e vice-reitor do Centro Universitário Positivo – UnicenP.

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