E eis que a novela do caso Cesare Battisti, que se acreditava terminada, acaba de ganhar novo capítulo. Poupado da sua extradição para a Itália por decisão do governo brasileiro, o italiano se vê agora confrontado com a possibilidade de ser deportado, como determinou a recente decisão da juíza federal Adverci Rates, titular da 20.ª Vara do Distrito Federal. O italiano chegou a ser preso na quinta-feira, para fins de deportação, mas foi solto algumas horas depois, diante da concessão de habeas corpus pelo TRF da 1.ª Região.
A sentença da magistrada, passível de recurso, determinou que Battisti está em situação irregular, pois o ato do Conselho Nacional de Imigração (CNI) que lhe concedeu o direito de permanência no Brasil seria nulo. A concessão teria violado o artigo 7.º, IV da Lei 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro), segundo o qual “não se concederá visto ao estrangeiro condenado ou processado em outro país por crime doloso, passível de extradição segundo a lei brasileira”. A extradição do ex-ativista para a Itália foi deferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF); entretanto, o tribunal máximo reconheceu que “a decisão de deferimento da extradição não vincula o presidente da República”, assentando “o caráter discricionário do ato do presidente da República de execução da extradição”. No último dia de seu mandato como presidente, Lula negou a extradição de Battisti para a Itália.
A deportação e a expulsão de estrangeiros são decisões discricionárias a serem tomadas pelo Poder Executivo
A decisão da juíza federal suscita alguns questionamentos de ordem legal. A deportação de Battisti implicaria sua extradição por via transversa, o que é vedado pela lei brasileira (arts. 63 e 91, IV do Estatuto do Estrangeiro). O objetivo da lei é impedir que um indivíduo cuja extradição tenha sido negada acabe sendo entregue por outras vias ao Estado que a requereu. A juíza, entretanto, sustentou que a deportação “não implica em afronta à decisão do presidente da República de não extradição, visto que não é necessária a entrega do estrangeiro ao seu país de nacionalidade, no caso a Itália, podendo ser para o país de procedência ou outro que consinta em recebê-lo”.
Data venia, a deportação implica, sim, afronta à decisão presidencial, na medida em que resultaria, em termos práticos, na extradição de Battisti por via oblíqua. Ainda que a deportação não seja para a Itália, este país já se manifestou no sentido de que pedirá a extradição do condenado ao Estado que o receber. A frustração do pedido de extradição diante da negativa do ex-presidente Lula seria, dessa forma, contornada se o Brasil deportar Battisti para um Estado que posteriormente o extradite para a Itália. Caso ele seja enviado para a França, por exemplo, como sugerido no processo, este país poderia entregá-lo imediatamente para a Itália, tendo em vista que já há decisão francesa deferindo a extradição do italiano. Foi essa decisão, aliás, que motivou a fuga de Battisti da França para o Brasil, em 2004.
Por fim, saliente-se que a deportação e a expulsão de estrangeiros são decisões discricionárias a serem tomadas pelo Poder Executivo. Tal qual no pedido de extradição, a palavra final sobre a deportação de Battisti caberá ao Executivo. E, pelas razões acima descritas, tal medida já não se revela mais uma alternativa legalmente viável.
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