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Neste mundo cada vez mais radicalizado e mais conflagrado pelo fanatismo será possível desfraldar a bandeira branca e interromper os banhos de sangue? Como convocar os pacifistas para interromper o confronto Israel versus Hesbolah, organização política dentro do Líbano que participa do seu governo, não se submete ao seu controle e ataca a população de um país vizinho?

Esse é um jogo de xadrez cujas regras ainda não foram escritas. Mas o tabuleiro e as respectivas peças estão visíveis. O mundo mudou entre este 2006 e 1914 (quando apareceram os primeiros focos de resistência ao conflito que viria a converter-se na 1.ª Guerra Mundial). Foram extintas as hostilidades formais entre nações e facções.

Mudaram apenas as aparências – não há guerras declaradas, luta armada aberta e permanente. Vista de longe, a terra continua azul como a viu o primeiro astronauta, Yuri Gagarin. Mais de perto, está impregnada de vermelho.

O pacifismo humanista e humanitário hoje não tem onde operar, a não ser a distância, como opção intelectual. Temos guerras em todos os continentes, inclusive na abençoada América do Sul.

As guerras civis nunca foram civis – sempre usaram exércitos, uniformes (completos ou não), bandeiras, armamento pesado e, tal como as guerras "militares", investem contra as populações que não estão engajadas nas batalhas (caso das Farc na Colômbia).

Diferentemente das guerras civis anteriores, as do século 21, são transnacionais como a da Espanha (1936–39) que se desenrolou num território, mas foi apoiada por controle remoto. O mesmo paradigma foi adotado nas chamadas "guerras de libertação nacional" da segunda metade do século passado, com envolvimento ostensivo das superpotências.

Os insurgentes do Iraque têm apoio do Irã (no caso do shiitas) e da Al Qaida (que opera a partir de um santuário localizado entre o Afeganistão e o Paquistão). Assim também o Hamas e o Hezbolah apoiados em diferentes graus e maneiras pela Síria e o Irã que contam com diferentes tipos de amparo da Rússia que, por sua vez, esmaga a ferro e fogo o separatismo islâmico na Chechênia.

Bem-vindos à nova desordem multipolar, proclamou o historiador inglês Timothy Garton Ash nesta sexta-feira (O Estado de S.Paulo, 21/7, p. A-13). Neste incêndio irrestrito, atiçado pelos poderosos refletores do ódio político, como empunhar algum estandarte pacificador ou convocar algum tipo resistência ao desvario?

Neste caos globalizado, como descodificar a declaração do nosso diplomata-mor, o ministro Celso Amorim, que considerou como "desproporcional" a reação israelense aos ataques do Hezbolah? O que seria considerado "proporcional"? Quantas pessoas podem morrer – com ou sem uniforme – para que um conflito seja tolerado pelos sensíveis negociadores internacionais?

O pacifismo foi capturado pela farsa da correção política, esta é uma verdade que precisa ser explicitada com toda a clareza. Ninguém tem coragem de condenar todos os combatentes, há sempre uma simpatia recôndita, uma transigência que abre exceções e admite algum tipo de brutalidade. O francês Romain Rolland, em 1915, não teve medo de enfrentar as patriotadas dos compatriotas e pronunciou-se candentemente contra todos beligerantes, inclusive contra o seu próprio país.

Esta coragem moral está cada vez mais escassa e manifesta-se primeiramente na incapacidade das chamadas "forças progressistas" para condenar com veemência qualquer tipo de terrorismo. O pacifismo pressupõe a abdicação radical do uso da força. Um pacifista autêntico não pode conviver com qualquer violência política, o círculo vicioso das respostas e represálias acabará sempre gerando as tais desproporcionalidades que tanto incomodam os diplomatas.

A busca da paz exige intransigências, tolerância zero com o terror.

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