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Comumente ouve-se falar que alguém tem vocação para ser professor. Vocação é termo que advém do latim, no sentido de "chamado", de um desejo interior que atrai para a tarefa nobre de disseminar o conhecimento. Há também quem reconheça no professor "o dom de ensinar", outra expressão de origem latina. Esta significa "presente", dádiva, dote natural para a docência. De outro lado tem-se também conhecimento de muitas situações que caracterizam a figura do professor como um idealista, ou até mesmo um abnegado que vive as agruras da baixa remuneração e da falta de reconhecimento.

São duas visões que, embora opostas, inegavelmente guardam algumas coincidências com a realidade dessa profissão. Mais uma que outra? Não. Muito mais uma outra ainda, uma terceira, do que estas duas primeiras.

Numa reportagem de tevê sobre a história da educação atraiu-me singularmente a atenção uma longa seqüência de imagens: desde pinturas medievais representando leitura nos mosteiros, passando por séculos de educação praticada por tutores no ambiente familiar, a ainda incipiente democratização do ensino com a criação das primeiras escolas, instantâneos de salas de aula com os olhares fortes de meninos e meninas direcionados a uma máquina fotográfica da época e lições escritas na lousa com a figura marcante do professor diante da turma. Elas revelavam o quanto a educação dos seres humanos foi ficando cada vez mais complexa com o passar do tempo e, conseqüentemente, o quanto a profissão do docente foi ganhando também complexidade. Não na mesma medida; muito maior ainda, uma vez que novas necessidades foram sendo incorporadas ao fazer do professor.

Se a razão fundamental da escola sempre foi, e continua sendo, a de garantir aos mais jovens a transmissão do capital cultural acumulado ao longo de gerações, esse seu papel foi expandido nas últimas décadas em função de novas necessidades da sociedade.

Vivemos um tempo de enormes transformações sociais promovidas pela rápida evolução da tecnologia e dos meios de comunicação, o que vem, por sua vez, acarretando profundas alterações nas formas de se produzir o conhecimento. Os saberes se ampliaram em leque e ganharam especificidades imprevistas até poucas décadas atrás. A quantidade de novas pesquisas foi redefinindo e multiplicando conceitos, colocando-nos diante de uma vastidão e agilidade de informação propiciadas pelo uso da computação.

Tão graves alterações no modo de produzir conhecimento e de realizar a comunicação vêm gerando, conseqüentemente, transformações radicais na organização da convivência das pessoas, nos modelos de família, nas formas de pensar, agir e sentir das novas gerações. É preciso compreeender que a celeridade desse processo exige também do professor uma formação que ocorre num quadro de contínuas mudanças e incertezas, para as quais, infelizmente, ninguém está pronto.

Vem então a dimensão terceira e decisiva para compor o papel do professor: nem dom ou vocação ‘a priori’, nem abnegação ou mesmo sacrifício, mas a dedicação e persistência como elementos indispensáveis para a formação continuada do docente. Uma formação que não pode se restringir ao currículo dos cursos universitários e necessita se expandir, principalmente no interior das instituições de ensino, através da orientação diante dos caminhos a serem trilhados e através da troca com seus pares.

Cada vez mais ganha força, inclusive no meio acadêmico, a formação de professores apoiada em relatos de vida em que estão imbricados o ser individual, o social e o profissional. Isto porque a identidade do profissional atravessa os tempos, desde a fase da opção pela carreira, passa pela formação inicial, pelas diferentes instituições onde a profissão se desenrola, e durante todo esse percurso segue marcada pelos momentos vividos como indivíduo. A troca entre seus pares num ambiente profissional rico de experiências é caminho seguro para alimentar o idealismo da vocação e ajudar a curar as feridas das frustrações diante de reveses. Boa viagem!

Yara Faria do Amaral é diretora da Escola Palmares.

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