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Os donos do Brasil e a tubaína

Kassio Nunes Marques durante sabatina no Senado: novo ministro do STF herdará 1,7 mil ações de Celso de Mello.
Kassio Nunes Marques durante sabatina no Senado: novo ministro do STF herdará 1,7 mil ações de Celso de Mello. (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

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Você acha que ele [Moro] seria um ministro leal às nossas causas?” (Jair Bolsonaro)

O presidente da República, Jair Bolsonaro, chega a ser risível, para não usar outro adjetivo, quando afirma que acabou com a Lava Jato porque não há mais corrupção em seu governo. Todos os que acreditaram que ele viria exatamente para combater fortemente a corrupção a partir de mecanismos jurídicos ficam pasmos e decepcionados. Incrível!

Da mesma forma, quando indagado por que não escolheria o ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro como novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) no lugar de Celso de Mello, que se aposentou, Bolsonaro argumentou que Moro não seria leal às suas causas. É de se perguntar ao presidente a quais causas se refere: as causas pessoais e de sua família? As do Centrão? Ou as causas da nação brasileira?

Sem sabermos exatamente quais causas são essas, Bolsonaro escolheu para tão importante cargo um amigo com quem toma tubaína, o desembargador Kassio Nunes Marques. Com um currículo bem controverso, quem sabe seja ele favorável às causas do presidente. Em sua tese de doutorado, Marques simplesmente copiou e colou trechos inteiros escritos por outro advogado. Plagiou, na maior cara dura.

Dias atrás, ele foi sabatinado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e aprovado no plenário do Senado. Era a oportunidade de os senadores cumprirem sua obrigação constitucional de saber o que é verdadeiro ou falso na vida de Marques e seu relatório acadêmico tão fissurado. Mas não quiseram evitar mais um desastre constitucional.

Kassio Marques nunca foi juiz na vida. Foi nomeado para a magistratura federal por Dilma Rousseff, é contra a Lava Jato, tem 33 representações disciplinares contra ele no Conselho Nacional de Justiça por reter processos por anos a fio, foi a favor da permanência do terrorista italiano Cesare Battisti no Brasil, e é contra a prisão de criminosos depois de serem condenados em segunda instância.

Como o jornalista J.R. Guzzo escreveu em recente artigo, “o novo indicado a ministro é o homem dos sonhos do mundo político brasileiro de hoje – agrada ao PT, ao Centrão, à OAB, aos ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, aos presidentes da Câmara e do Senado, às empreiteiras de obras públicas, aos refugiados da Lava Jato, aos escritórios ‘top de linha’ da advocacia criminal, aos defensores das ‘instituições democráticas’, à classe intelectual, ao presidente Bolsonaro, à família do presidente Bolsonaro e por aí vamos”.

“O nome que o presidente Jair Bolsonaro indicou para a vaga no STF tem todos os requisitos para ser a pior de todas as decisões que tomou no seu governo. E ano que vem ele pode piorar ainda mais, já que haverá nova nomeação com a saída do ministro Marco Aurélio Mello”, emendou Guzzo. Aliás, “Narco Aurélio do Supremo Cartel Federal”, como já foi apelidado, por ter soltado o chefe do PCC André do Rap, considerado de altíssima periculosidade, além de outros 92 criminosos e traficantes que se beneficiaram de suas decisões só neste ano. Deveria, isso sim, renunciar.

Para isso os ministros do STF são bons: soltar traficantes, suspender processos contra políticos, engavetar processos, libertar quem pode pagar mais, garantir que os acusados de corrupção sejam deixados em paz etc. A garantia dessa impunidade não tem preço para os donos do Brasil. Quem mais deveria respeitar a Constituição do Brasil, além do presidente da República, são os que menos a respeitam.

São 11 os ministros do STF. Eles se acham os donos do Brasil. Sem terem concorrido a qualquer pleito eleitoral ou nem sequer recebido um voto dos brasileiros, determinam o que 220 milhões de brasileiros devem fazer. São eles que se imiscuem em assuntos do Executivo e Legislativo, muitas vezes em total afronta à Constituição. Neste país, aliás, são comuns as interferências indevidas entre os três poderes, em vergonhosa promiscuidade.

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São os 11 que decidem se as notícias vinculadas pela imprensa são verdadeiras ou falsas, ou que determinam demarcações em terras indígenas. São eles que votam em separado, um desfazendo a decisão de outro, criando insegurança jurídica no país. São eles que engavetam processos até a prescrição. São artistas midiáticos. Enfim, são os representantes da ditadura do Judiciário!

Fico imaginando qual legado deixarão os ministros do STF para a posteridade. Quais desses senhores chegam aos pés de uma Ruth Bader Ginsburg, juíza da Suprema Corte dos EUA recentemente falecida e merecidamente homenageada? Eles não têm estofo, chegam a ser medíocres. Creio até que o Supremo esteja entre as instituições mais mal-vistas, desacreditadas e até odiadas, pois faz mais mal que bem para o país. Talvez eles nem se preocupam em deixar qualquer legado honrado. O importante é viver o dia a dia nas mordomias de sua Bastilha.

Cláudio Slaviero é empresário, ex-presidente da Associação Comercial do Paraná e autor de “A vergonha nossa de cada dia”.

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