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A avaliação da oferta de serviços de saúde no país nos revela que, certamente, acumulamos vários avanços, mas somos obrigados ainda a conviver com sérios problemas que precisam ser enfrentados sob pena de comprometer a assistência oferecida à população.

O Sistema Único de Saúde (SUS), criado em 1988, representou uma mudança profunda de paradigma ao estabelecer diretrizes como universalidade de acesso, equidade, integralidade, gratuidade e controle social. Trata-se de um modelo exemplar do ponto de vista teórico, reconhecido internacionalmente e fruto da luta empreendida pelo movimento da Reforma Sanitária brasileira.

As conquistas alcançadas se amparam nos princípios fundamentais desse modelo. Desde então, esse arcabouço serve de bússola à formulação das políticas públicas de saúde no país. No entanto, existe ainda uma enorme distância entre o compromisso assumido em seu escopo legal e a realidade das ruas.

Claro que os êxitos se acumulam. Podemos citar a amplitude das campanhas de vacinação, a oferta de serviços de alta complexidade por meio do sistema nacional de transplantes e a assistência ampla e gratuita aos portadores de HIV. Cada uma dessas frentes representa um trabalho sério, com resultados sólidos e positivos nos indicadores de saúde.

No entanto, há fragilidades históricas que ainda não foram superadas. O sucateamento da rede hospitalar, a dificuldade de fixar o médico em áreas de difícil provimento e o estrangulamento das emergências, que se traduzem nas filas e no desconsolo dos pacientes, pontuam entre os temas que ainda exigem uma resposta.

Esse balanço nos faz acreditar que, mesmo após 22 anos, o SUS permanece como um belo projeto, ainda não concluído. E como garantir que a utopia ganhe vida plena? Como provocadores dessa reflexão, apontamos ao menos duas saídas.

A primeira é a definição de uma fonte de financiamento estável para o SUS. A regulamentação da Emenda Constitucional 29, que há anos se arrasta pelo Congresso Nacional, urge pelo engajamento do governo e pela união de forças políticas que a levem a sua aprovação definitiva.

A segunda saída se relaciona à valorização dos médicos. Para tanto, a criação de uma carreira de estado para esses profissionais permitiria levar assistência aos brasileiros de todos os cantos do país. Tal compromisso implica assegurar aos profissionais infraestrutura de trabalho, uma rede integrada capaz de absorver os casos mais graves e salários compatíveis com as exigências pertinentes.

Enfim, há que se olhar também para o profissional, para o médico que atende no posto de saúde ou no hospital, no campo ou na cidade. A solução proposta, que se baseia modelo já adotado pelo Poder Judiciário e Ministério Público, tem condições de contribuir para tornar concretas a universalidade e a integralidade da assistência.

O tema – que já tramita no Congresso sob a forma de emenda constitucional e tem sido discutido de forma favorável dentro do Ministério da Saúde – deve gerar um profundo aperfeiçoamento da política de recursos humanos no SUS. Sem contar que aporta modernidade à gestão do modelo assistencial brasileiro pelo reconhecimento dos direitos daqueles que o fazem funcionar.

Os médicos, por meio de suas entidades representativas, cobram dos gestores do SUS respostas para os desafios que se impõem. Assim, procuramos estabelecer uma linha crítica construtiva alertando a tomadores de decisão sobre a necessidade de agir em prol da boa medicina e do bem-estar do cidadão, sempre observando os princípios e as diretrizes do SUS. A sociedade deve estar atenta e exigir ação dos gestores, sob pena de assistir à falência do sonho do Sistema Único de Saúde. Tal derrota comprometeria a manutenção das conquistas já alcançadas e tornaria inviável trilhar novos e promissores caminhos.

Roberto Luiz d’Avila é presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM)

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