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Ao longo da história do Brasil, o crédito nunca teve grande participação perante o total de riqueza produzida. O volume total de crédito tomado pelas famílias, excluindo aquele que é destinado às empresas e ao governo, historicamente permaneceu abaixo dos 5% do PIB. Contudo, a partir da estabilização econômica acontecida no Brasil com a instauração do Plano Real em 1994, a estabilidade dos preços e do poder de compra dos salários motivou um crescimento sem precedentes no endividamento pessoal, principalmente o destinado à aquisição de produtos de alto valor, como eletrodomésticos, veículos e casa própria. Mesmo assim, até o final dos anos 90, tínhamos um baixo nível de endividamento pessoal no Brasil, justificado pelas altas taxas de juros e pelas poucas alternativas ao crédito (não havia ainda a instituição do empréstimo consignado, descontado em folha de pagamento ou dos rendimentos da previdência). Também até o início de 2000, as instituições financeiras não identificavam na população de renda média e baixa um público rentável para operações de crédito, restringindo muito a oferta de empréstimos, principalmente às classes C e D da economia.

A proliferação das operações financeiras permitiu a todos os cidadãos que de alguma forma comprovem rendimentos, mesmo baixos, tomar dinheiro emprestado. Redes de lojas e supermercados também criaram seus próprios cartões de crédito e viabilizaram mais um canal de endividamento pessoal e, mais recentemente, as próprias operadoras de cartão de crédito iniciaram estratégias de expansão de sua base de cliente apostando no público de baixa renda. Nesse sentido, percebe-se que essas lojas não vendem mais produtos e sim financiamento. Chegamos, assim, a um cenário de oferta generalizada de crédito na economia. Com ele, o crescimento econômico constante que a economia brasileira desfrutou nestes últimos cinco anos (que em parte se explica pela própria expansão do crédito), confere ao crédito na economia uma importância muito maior do que historicamente ele tinha. Desde o ano 2006 a participação do crédito das famílias no PIB dobrou, beirando os 10% do PIB e cresce num ritmo acelerado de 25% ao ano, muito acima do ritmo de crescimento do PIB.

O crédito está provocando um aumento perigoso do comprometimento da renda das famílias. Com taxas acima de 50% ao ano para pessoas físicas, o pagamento de juros está se tornando um item de grande peso no total dos gastos das famílias, comprometendo sua capacidade de consumo que na média já ocupa para as classes B e C, cerca de 20% do orçamento familiar. Outro fator preocupante é o aumento da inadimplência. Com o aumento do endividamento, qualquer distúrbio no padrão de rendimentos de uma família provoca o atraso de seus compromissos financeiros. Em 2008 o total de dívidas atrasadas acima de 90 dias superou os R$ 12 bilhões – ou 5% do total do crédito dado às famílias – e esse valor vem crescendo ainda mais nos últimos meses. A realidade do crédito na economia brasileira é muito preocupante, pois é um crédito caro e está financiando agora consumo de bens não duráveis, como compras em supermercados e o abastecimento de combustível do carro. Por outro lado, a economia se viciou neste artifício: sem o crédito as vendas caem e a economia não cresce. Com a expansão desmedida e sem critério, os anacronismos persistem.

Hugo Eduardo Meza Pinto, José Antonio Soares e Paulo Vagner Ferreira são professores das Faculdades Integradas Santa Cruz de Curitiba.

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