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No auge do julgamento do mensalão, o ex-tesoureiro do PT, debochando do que estava acontecendo, disse que o tempo se encarregaria de reduzir tudo aquilo a uma piada de salão. Ele provocou as mais diversas reações: desde a indignação até comentários como "ele sabe o que diz; afinal, esses temas sempre acabam em pizza". Pois bem, concluído o processo, com a condenação, inclusive, do tal tesoureiro, a primeira reação foi a de que ele não tinha acertado no prognóstico. Contudo, examinando fatos posteriores ou anteriores ao mensalão, e que foram descobertos durante e após o processo no Supremo Tribunal Federal, fiquei na dúvida: o escárnio de então não seria uma previsão a respeito de coisas já conhecidas do tesoureiro e de coisas que ele, com a experiência que tinha no contato com seus companheiros de partido, de alguma forma intuía que possivelmente viriam a ocorrer, envolvendo pessoas e valores substanciais , mais graves que os constatados no processo do mensalão?

Os fatos que se tornaram conhecidos parecem dar razão ao ex-tesoureiro. Ele sabia do que estava falando. Para exemplificar e relembrar, registro alguns deles: o episódio do empregado da casa no Lago Paranoá, que teve o seu sigilo bancário violado por autoridades do governo federal para esvaziar declarações por ele prestadas, incriminando altos escalões da burocracia; o caso do ministro que teve a fortuna pessoal aumentada sem explicações razoáveis, pelo menos até agora; ministros que mantinham contratos de assessoria até hoje não muito esclarecidos; o episódio envolvendo as concessionárias/distribuidores de energia elétrica, com reflexos diretos sobre o fornecimento aos consumidores, cuja conta por eles será suportada nos próximos anos; os voos com aviões da FAB para recreio de eminências da República; a malfadada compra de uma refinaria pela Petrobras e a frustrada associação dela com a Venezuela, para a construção de uma outra, sem que esta tenha aportado um centil, acarretando um custo quase decuplicado; o regime de "trabalho" imposto aos médicos cubanos, com um significando mais amplo: típica invasão de soberania, submetendo-se relações jurídicas ao império de leis e contratos, oriundos de ordenamento jurídico estrangeiro, em flagrante violação da Constituição e das leis brasileiras.

Isto, por baixo, monta a mais de R$ 20 bilhões que, comparados com o que foi o mensalão – R$ 150 milhões de reais, na perspectiva mais exagerada –, representam cerca de 150 vezes o valor que ensejou a condenação dos réus pelo Supremo Tribunal Federal. Sem falar que os envolvidos extrapolam o número dos ditos mensaleiros.

Só faltaria, como arremate final, reforçando a previsão do ex-tesoureiro, que, no indulto de Natal, ato privativo do presidente da República, se contemplasse o núcleo político do mensalão. Sem muito esforço, isso pode se consumar. Basta reeditar, em 2014, o decreto de 2013 para que pelo menos dois dos mais destacados dentre eles fiquem livres, leves e soltos.

Derocy Giacomo Cirillo da Silva é procurador da República aposentado.

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