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A cooperação é a mais justa e equilibrada engrenagem produtiva criada pelo ser humano. Não existe nenhum sistema mais próximo da meritocracia que o cooperativismo, pois nele o ganho é proporcional ao esforço de cada um. As cooperativas desenvolvem as regiões onde atuam pelo simples fato de que a riqueza gerada é reinvestida no próprio lugar.
Para o leitor ter uma noção do papel das cooperativas na vida de todos nós, proponho um exercício abstrato. Imagine um mundo sem elas. Como um roteiro de ficção, vamos supor que um apocalipse zumbi varresse do mapa todas as cooperativas. Digamos que, do dia para a noite, o verbo “cooperar” desaparecesse dos dicionários.
Para começo de conversa, precisaríamos riscar do mapa 280 milhões de empregos gerados pelas cooperativas no mundo. Imagine um contingente do tamanho da população do Brasil – estimada em 212 milhões de habitantes em 2020 – e mais 68 milhões de pessoas sem os seus postos de trabalho. Isso equivale a quase 10% do total de vagas existentes no mundo.
Se o sumiço de um décimo dos empregos já seria algo impensável, a saída de cena do cooperativismo traria outros impactos que nem o mais talentoso roteirista poderia imaginar. A começar pela subsistência de 1,2 bilhão de cooperados, os donos dos 3 milhões de cooperativas existentes no mundo. Sem as 300 maiores cooperativas do mundo, deixaria de ser gerado um faturamento anual de US$ 2,1 trilhões, superior ao Produto Interno Bruto (PIB) da Itália e quase igual ao da França.
Colocando uma lupa no cenário ficcional, vamos nos concentrar no Brasil e imaginar o que seria da nossa economia sem as cooperativas. São praticamente 50 milhões de brasileiros que têm direta ou indiretamente no cooperativismo uma fonte de trabalho e renda, segundo a edição mais recente do Anuário do Cooperativismo Brasileiro, publicado em 2019.
Municípios inteiros precisariam se reinventar. Analisando apenas as cooperativas brasileiras que se dedicam ao comércio exterior, além de movimentar a economia dos estados, elas hoje respondem por 100% das exportações de mais de 30 cidades brasileiras. Na área da saúde, cerca de 25 milhões de brasileiros deixariam de ser atendidos através de seus planos pelas cooperativas médicas e odontológicas. Serviços de táxi e mototáxi sumiriam dos aeroportos, rodoviárias e centros urbanos.
E seria provavelmente pela mesa que você começaria a notar a ausência do cooperativismo, pois muita coisa desaparecia do cardápio dos brasileiros. Carne, arroz, legumes, trigo, ovos, leite, queijo, iogurte, embutidos e até o cafezinho de todo dia são produzidos por 1 milhão de associados e 210 mil trabalhadores das cooperativas do ramo agropecuário.
Por fim, quero falar de um setor que conheço bem há mais de duas décadas: o cooperativismo de crédito. Só que aqui não precisamos recorrer a um roteiro imaginário, pois existe um vácuo reconhecido pelo próprio Banco Central. A verdade é que o país precisa de mais cooperativas de crédito, pois elas são a melhor alternativa à concentração bancária, e o Banco Central trabalha para aumentar de 8% para 20% a fatia do cooperativismo no Sistema Financeiro Nacional até 2022.
Felizmente, esse filme jamais entrará em cartaz. Na vida real as cooperativas estão e sempre estarão presentes no nosso dia a dia, fortes e saudáveis, gerando trabalho e ajudando a construir um mundo com mais oportunidades. E o melhor é saber que, para impulsionar tudo isso, basta uma simples decisão de cada um de nós. A livre adesão é um pilar sólido do cooperativismo – é só participar.
Marcelo Vieira Martins é CEO da Unicred União.