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O julgamento da trama golpista é nulo. Assusta ver um processo como este no STF e constatar a engrenagem construída pelo ministro Alexandre de Moraes para punir adversários. Desde 8 de janeiro de 2023, o Supremo deixou de ser guardião da Constituição para agir como quem investiga, acusa e julga por critérios políticos. O resultado é que a Constituição vira obstáculo a ser contornado.
O primeiro desvio, muito antes do julgamento, foi manter no STF processos mesmo após o fim do mandato presidencial. A Constituição é clara neste sentido, foro especial só vale para presidentes em exercício. Em 2025, a Corte reinterpretou a regra e disse que, se os fatos estiverem ligados ao cargo, mantém a competência. Nos casos de Lula e Michel Temer os processos foram remetidos à primeira instância ao deixarem o Planalto. Criou-se uma exceção sob medida, violando o art. 5º, LIII da Carta Magna.
Até agosto de 2025, mais de 640 pessoas foram condenadas, muitas por golpe de Estado ou abolição violenta do Estado Democrático de Direito, com “provas” restritas a postagens ou presença em atos anteriores
Outro rompimento atingiu o sistema acusatório. O artigo 3º-A do Código de Processo Penal veda a iniciativa probatória do juiz; ao Ministério Público (art. 129, I) cabe investigar e acusar. Moraes, porém, conduziu 300 perguntas em audiência, assumindo papel claro de inquisidor. O procurador-geral, Paulo Gonet fez, outras 59. Mensagens de Eduardo Tagliaferro indicam uma PGR alinhada ao gabinete, com denúncias em “pacotinhos” de centenas de nomes. O freio e contrapeso virou engrenagem.
A imparcialidade cedeu à perseguição. Prisões preventivas em massa apoiaram-se em “certidões positivas”, relatórios que rotulavam manifestantes por postagens antigas. Empresários tiveram bloqueios e buscas baseados em vazamentos de WhatsApp. Jornalistas como Rodrigo Constantino e Guilherme Fiuza foram punidos por opinar. Quando mensagens atingem opositores, viram prova; quando alcançam ministros, viram crime de quem divulga.
O caso Mauro Cid expõe outro nível. Preso em 2023, só saiu da cadeia após delação. Áudios apontaram coação. A Meta confirmou conta de Instagram ligada a ele e à esposa, usada para comentar termos do acordo, violando sigilo. Mesmo assim, a delação foi mantida porque sustenta a acusação. Prova sob coação e com quebras flagrantes não deveria subsistir.
Até agosto de 2025, centenas de pessoas foram a julgamento e condenadas, muitas por golpe de Estado ou abolição violenta do Estado Democrático de Direito, com “provas” restritas a postagens ou presença em atos anteriores. Veio indenização coletiva de até R$ 30 milhões. O volume de sentenças evidencia a máquina, mas não para aplicar a lei, e sim para consolidar uma narrativa.
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Relatórios retroativos, mapas mentais encomendados e papéis para justificar operações decididas sem nenhum critério. A denúncia de Tagliaferro teve a resposta padrão, em vez de apurar, abriu-se inquérito contra o delator. O recado é claro, quem denuncia o abuso também vira alvo.
O risco maior é normalizar o desvio. Hoje a engrenagem se volta contra a direita; amanhã pode atingir qualquer grupo que incomode. Constituição posta de lado, sistema acusatório desmontado, liberdade de imprensa virou concessão precária. Quando a toga vira instrumento de poder, não resta justiça, não há julgamento justo; só resta perseguição política. O teatro de toga segue em cartaz; a peça já não é sobre o Estado de Direito, e sim sobre a vontade de quem se julga acima da lei.
Ramiro Rosário é vereador de Porto Alegre pelo Partido NOVO.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos



