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Professores ou máquinas: formando estudantes no mundo digital

(Foto: Albari Rosa/Foto Digital/Gazeta do Povo)

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A tecnologia tem ganhado cada vez mais destaque na educação, principalmente por seu potencial em despertar o interesse dos estudantes pelo aprendizado. No entanto, não é suficiente apenas gerar engajamento; é preciso que o ensino seja realmente eficiente. Para que as ferramentas digitais se tornem aliadas estratégicas no processo de ensino-aprendizagem, é necessário que sejam utilizadas de forma criativa e significativa, tanto por alunos quanto por professores.

Cerca de  40% das instituições de ensino utilizam plataformas e ambientes virtuais de aprendizagem nas salas de aula, segundo a pesquisa TIC Educação. Porém, a eficiência não se resume apenas a disponibilizar dispositivos como computadores, tablets ou inteligência artificial (IA) aos estudantes. Então, fica a questão: como podemos aplicar as tecnologias de forma eficaz para moldar o futuro da educação?

A computação já faz parte do nosso cotidiano de forma invisível. Por exemplo, imagine um grupo de 22 crianças indo para um acampamento. Como elas podem calcular quantas barracas serão necessárias se cada uma delas comporta quatro crianças? A solução para essa questão envolve um processo simples, mas que é, na prática, uma abordagem computacional: tira-se de quatro em quatro, cinco vezes, para perceber que precisamos de seis barracas. Este exemplo básico ilustra como o pensamento computacional pode ser utilizado para resolver problemas simples do dia a dia.

Agora, imagine que algumas dessas crianças se interessem pelos pássaros e pela maneira que voam em grupo, seguindo padrões específicos. Outras observam que a lua pode ser vista durante o dia, o que as leva a questionar o motivo dela normalmente ser associada à noite. A tecnologia, por meio da modelagem computacional, oferece a oportunidade de simular esses fenômenos e explorar suas complexidades de forma dinâmica. Com o uso de um computador, as crianças não apenas observam, mas também experimentam, testam teorias e variáveis, aprofundando sua compreensão em temas que despertam sua curiosidade.

A computação, aliada à robótica e à IA, oferece ferramentas poderosas para a criação de um aprendizado significativo, personalizado e crítico. No entanto, o sucesso dessa transformação depende da escuta atenta às necessidades da comunidade educacional

Esse processo investigativo incentiva a análise, a formulação de perguntas e a busca por soluções, o que impulsiona o desenvolvimento do pensamento crítico e criativo para desenvolver saídas inovadoras para os problemas que encontram. A robótica, por sua vez, oferece uma experiência única ao integrar o mundo físico com a teoria, permitindo que os alunos interajam diretamente com os conceitos estudados. Ao construir e programar robôs, os estudantes podem ver na prática como as decisões algorítmicas afetam o comportamento de uma máquina e aprender sobre lógica, estrutura e processos.

No entanto, como qualquer outra tecnologia, a robótica deve ser usada com planejamento cuidadoso, alinhando-se à proposta pedagógica do educador e fazendo parte de um projeto educacional bem estruturado. O verdadeiro poder da robótica e de outras tecnologias educacionais está na sua capacidade de se adaptar às necessidades do aprendizado, sem impor limitações, mas ampliando as possibilidades.

Uma pesquisa da Associação Nova Escola revela que 65% dos professores conhecem e utilizam Inteligência Artificial (IA) em sala de aula, e 57% consideram-na uma oportunidade. No entanto, vale destacar que apesar de seu grande potencial, a IA não deve substituir o papel dos professores, mas sim complementá-los, ampliando suas capacidades. Ela pode apoiar os educadores a adaptar o conteúdo para atender às necessidades específicas de suas turmas.

Por exemplo, se um professor está trabalhando em um conteúdo sobre consumo de energia doméstica, mas os alunos demonstram interesse na poluição gerada pelos combustíveis fósseis, a IA pode adaptar o material para explorar esse viés ambiental, criando uma conexão mais forte com os interesses dos estudantes. Isso não só aumenta a relevância do aprendizado, mas também mantém a motivação dos estudantes.

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Além disso, a automação de tarefas repetitivas, como a correção de atividades, pode liberar mais tempo para os professores se concentrarem em interações mais significativas com os alunos. Ao reduzir o tempo gasto em tarefas mecânicas, a IA permite que os educadores invistam mais energia no aspecto humano e estratégico do ensino.

Outro exemplo interessante é o que chamo de "dificuldade controlada". Se um aluno encontra dificuldade em uma tarefa, ele pode pedir para a Inteligência Artificial uma versão mais simples, adequada ao seu nível, para que possa progredir naquele tema de maneira gradual. Isso cria um ciclo de aprendizagem contínuo, com a IA atuando como uma ferramenta para impulsionar o desenvolvimento do aluno, oferecendo desafios no seu ritmo.

É comum que um mesmo exercício seja fácil para alguns estudantes e desafiador para outros. Para tornar o processo de aprendizagem mais eficiente, o aluno pode recorrer à IA com um comando (prompt) como: 'Esse exercício está muito difícil para mim, poderia criar uma versão mais simples que eu consiga resolver sozinho e, assim, voltar ao original depois?'. Da mesma forma, aquele que encontra facilidade na tarefa pode solicitar variações mais desafiadoras, personalizando o nível de dificuldade de acordo com seu ritmo de aprendizagem.

Apesar do potencial transformador das tecnologias, nunca devemos esquecer que o nosso papel de educador é insubstituível. A tecnologia pode ajudar nas tarefas repetitivas e mecânicas, mas o que realmente faz a diferença na sala de aula é a relação humana, a capacidade de conectar-se com os alunos e de criar um ambiente de aprendizagem acolhedor e significativo.

A verdadeira inovação ocorre quando a tecnologia complementa a experiência educacional, permitindo que os professores se concentrem nas questões mais complexas e nas interações que realmente importam. Esse é apenas o começo de uma jornada inovadora. A humanidade ainda está explorando as formas criativas e eficazes de integrar a tecnologia na educação. O dinamismo, a qualidade e o acolhimento são elementos-chave para o desenvolvimento do setor educacional, e a tecnologia tem o potencial de integrar esses três aspectos de maneira única.

A computação, aliada à robótica e à IA, oferece ferramentas poderosas para a criação de um aprendizado significativo, personalizado e crítico. No entanto, o sucesso dessa transformação depende da escuta atenta às necessidades da comunidade educacional, da adaptação das tecnologias ao contexto específico de cada turma e da construção de um projeto pedagógico sólido.

Guilherme Silveira é professor, Chief Innovation Officer (CINO) e cofundador da Alura, ecossistema de educação em tecnologia.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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