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Proibição de consumo de qualquer quantidade de álcool. Proibição da contratação de parentes. Proibição da utilização de carros a certas horas ou em certos dias da semana. Qual será a próxima proibição? Toda decisão ditatorial, seja ela expressão da ditadura do Executivo, do Legislativo ou Judiciário, é perigosa. Perigosa porque traz uma solução rápida, aparentemente eficaz e que atende às necessidades dos cidadãos, mas que na essência tem uma base simplista e que não contribui para o desenvolvimento da sociedade. Quanto à proibição do consumo de qualquer quantidade de álcool pelos condutores de veículos, os dados parecem acenar para a correção da opção do Legislativo. Diminuição expressiva dos índices de acidentes e mortes nas estradas e ruas. Será que os dados decorrem do ato impositivo, que não discrimina as dosagens e características individuais, ou do aumento da fiscalização? E se a fiscalização tivesse sido incrementada antes da mudança da lei? E se a acomodação reverter os dados e as mortes e mutilações continuarem enlutando?

No que se refere ao nepotismo, o Judiciário proibiu a contratação de parentes em cargos de confiança, salvo do primeiro escalão. Fácil, alça-se tais parentes aos cargos mais altos no executivo e a essência do problema permanece. Outros serão exonerados, sempre com a possibilidade de contratação por outras autoridades, como retribuição de medida equivalente.

Quanto ao rodízio de veículos, ou à criação de pedágio para circulação no centro da cidade, como ameaça o Executivo, mais uma vez proíbe-se algo e o problema desaparece. Desaparece? Por quanto tempo? Não há como utilizar-se de um modelo criado numa cidade de primeiro mundo, na qual os meios de transporte coletivo atingiram uma situação de comprovada excelência, como parâmetro para a restrição de direitos sem a contrapartida satisfatória e de qualidade.

Nos três casos, as determinações autoritárias normalmente são repassadas como a solução das soluções. São normalmente sonoras e vistosas, mas perigosas. Medidas ditatoriais retiram faculdades e direitos e só se justificam na excepcionalidade.

Educar para o consumo consciente de álcool, criar a cultura de seriedade no campo das contratações com dinheiro público, ofertar um sistema de transporte coletivo eficiente, planejado, digno para todas as camadas da população, são soluções que não se fazem por decreto. Atos ditatoriais, ao mesmo tempo em que aliviam a carga de pressão popular sobre as autoridades, ganham espaço na comunicação, enfraquecem as proteções do indivíduo em relação aos titulares do poder estatal. Pode-se pensar numa outra solução, mais comprometedora dos gestores e bem mais onerosa: planejar, educar e responsabilizar. Vou me limitar à necessária responsabilização.

No que se refere ao consumo de álcool e a direção está constatado que a embriaguês pode ser coibida com leis severas a aplicadas a quem as mereça, e não com proibições para o incauto que aceita um minicálice de vinho do porto, ao final de um jantar. Para o nepotismo, a autoridade que contratar pessoas de sua família ou não, em qualquer cargo de confiança – que no meu entendimento devem ser limitadíssimos – sem qualificação técnica para o desempenho da função deve ser afastada liminarmente, sem remuneração, bastando para isso denúncia do Ministério Público, acolhida por autoridade do Judiciário enquanto se apura a denúncia. No caso de confirmação da ilegalidade da contratação, imposição de pena de impedimento absoluto de acesso a cargo ou função pública, dentre outras. Isso pressupõe denúncias fundamentadas, processos e decisões rápidos. Sobre as restrições à liberdade de locomoção nas cidades, a solução é planejamento, honestidade e implementação de transporte público acessível, seguro, universalizante.

Marcia Carla Pereira Ribeiro é procuradora do estado do Paraná e professora de Direito da UFPR e da PUCPR.

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