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A Lei n.º 12.842, de 10 de julho de 2013, que dispõe sobre o exercício da Medicina, visava regulamentar a profissão de médico, e somente essa, no Brasil. Visava porque, com os vetos parciais da presidente Dilma Rousseff, o projeto, debatido por 12 anos no Congresso Nacional, com a realização de diversas audiências públicas e várias correções no texto, foi completamente desconfigurado e perdeu seu propósito. Com praticamente todas as demais profissões da área de saúde já regulamentadas, é fundamental para a sociedade que as atribuições específicas do médico sejam definidas por lei, garantindo atendimento de qualidade à população, e diminuindo sua exposição ao risco de receber algum procedimento de saúde por um profissional não habilitado.

O Ato Médico não interfere nas atribuições de nenhuma outra profissão já regulamentada neste país, e isso fica bem claro no parágrafo 7.º do artigo 4.º da lei. "O disposto neste artigo será aplicado de forma que sejam resguardadas as competências próprias das profissões de assistente social, biólogo, biomédico, enfermeiro, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, nutricionista, profissional de educação física, psicólogo, terapeuta ocupacional e técnico e tecnólogo de radiologia".

Assim, a lei, em seu artigo 4.º, em que define as atividades privativas do médico, excetua deste rol nove procedimentos já amparados na regulamentação de outras profissões da saúde, como aplicação de injeções subcutâneas, intradérmicas, intramusculares e intravenosas, de acordo com a prescrição médica, a aspiração nasofaringeana ou orotraqueal, a realização dos exames citopatológicos e seus respectivos laudos e, claro, o atendimento à pessoa sob risco de morte iminente, entre outros.

De maneira alguma o Ato Médico visa criar uma "atadura" aos demais profissionais de saúde. Além da necessária regulamentação da profissão, a lei é uma defesa para evitar a prática ilegal de medicina (disfarçada de prática alternativa nova), visando a proteção da saúde comum, uma vez que as funções do médico ficariam agora estabelecidas em lei, mais rígida e melhor fiscalizada.

Os vetos presidenciais têm como principal justificativa a dificuldade de se adequar o Sistema Único de Saúde (SUS) à nova lei. Não é de se admirar. O que vemos hoje no SUS são, por falta de estrutura, profissionais não médicos, até assistentes sociais, fazendo diagnóstico, encaminhando pacientes para procedimentos, solicitando exames e, inclusive, prescrevendo medicamentos, uma receita para equívocos que podem fazer a diferença entre a vida e a morte para os pacientes. Vale lembrar que, mesmo com o veto, tais tarefas não constam no rol de atividades destas profissões e, assim, essa prática já é vedada pela legislação.

A volta do debate sobre o mérito da lei que institui o ato médico é um retrocesso, além de um desrespeito a todo o processo democraticamente instituído para a formulação de leis no país. Em sua década de tramitação, o projeto de lei foi debatido por inúmeras comissões, audiências públicas e negociações, chegando a um produto final que representava um consenso – inclusive com ampla participação de representantes das demais profissões da área da saúde –, razão que motivou sua aprovação pelo Congresso Nacional.

A questão do mérito do ato médico já foi encerrada; a questão que fica agora é a seguinte: se o Congresso Nacional não rejeitar os vetos parciais, permitindo que o Poder Executivo assuma a capacidade de legislar, para que serve o Congresso Nacional?

João Carlos Baracho é presidente da Associação Médica do Paraná.

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