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Quando o assunto é tecnologia e inovação, o Brasil não deixa a desejar

(Foto: Alex Knight/Unsplash )

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É quase uma verdade absoluta: "Ah, lá fora é muito melhor." Se você perguntar para qualquer pessoa no Brasil onde estão as melhores oportunidades para inovação e tecnologia, a resposta será automática: Estados Unidos, Europa, os grandes centros. A gente ouve isso tanto que começa a acreditar que, porque vivemos no Brasil, estamos um passo atrás. Afinal, eles são países de "primeiro mundo", com infraestrutura de ponta, acesso facilitado a capital e uma cultura mais "avançada". Só que a realidade não é bem assim.

Recentemente, passei quatro meses viajando por 14 países como nômade digital: EUA, Países Baixos, Itália, Bélgica, Portugal, Espanha, França, Mônaco, Suécia, Dinamarca, Reino Unido, Alemanha, Polônia e República Tcheca. Foi uma experiência que me deu a oportunidade de ver de perto o ecossistema de inovação desses lugares, participar de eventos de tecnologia e negócios, e conversar com investidores, startups e aceleradoras locais. E sabe o que eu descobri? O Brasil pode não ter a mesma infraestrutura, mas em termos de talento, criatividade e capacidade de execução, não estamos nada atrás em termos de tecnologia e inovação. Em muitos aspectos, na verdade, estamos na frente.

Quem sabe, em alguns anos, ao invés de olharmos para fora com tanta admiração, outros países estarão olhando para o Brasil como o próximo grande centro de inovação

Se há algo que eles têm de diferente, com certeza é a infraestrutura. Algumas leis são mais favoráveis ao empreendedorismo, o acesso a capital é menos burocrático e muito mais abundante, e o ecossistema de inovação já está mais consolidado. Isso facilita o caminho para muitas startups decolarem mais rápido. Enquanto isso, aqui no Brasil, o ambiente regulatório para a inovação é mais desafiador, o acesso ao capital é uma missão complicada (por que alguém vai investir em startups se pode ter um retorno de 12%+ a.a na renda fixa?) e a burocracia nos persegue em cada passo.

Mas o que eu percebi ao longo dessas viagens é que não é só a infraestrutura que faz o sucesso de uma startup ou de um empreendedor. A criatividade, a capacidade de inovar e de se adaptar às adversidades contam muito, e nisso, o brasileiro é campeão. Estamos acostumados a driblar desafios que muitos empreendedores estrangeiros nem imaginam. Se há um problema, a gente dá um jeito, se não há recurso, a gente cria uma solução. Essa resiliência e essa capacidade de improvisação são atributos que nos colocam em um patamar de competitividade global. Eu faço uma aposta com quem quiser: pegue um empreendedor de sucesso lá fora e o faça começar do zero no Brasil, sem poder usar dinheiro ou contatos prévios, e a chance dele dar certo de novo é muito mais baixa do que se fizer a mesma coisa com um brasileiro no cenário inverso.

Outra coisa que muitos não percebem é o tamanho do nosso mercado. O Brasil é um dos poucos países no mundo que pode se dar ao luxo de olhar apenas para o seu próprio mercado. Com mais de 200 milhões de pessoas, somos um dos maiores mercados consumidores do planeta. Para efeito de comparação, países como Holanda, Bélgica ou Dinamarca, por exemplo, têm que pensar em uma estratégia global desde o primeiro dia, porque seus mercados internos não sustentam grandes expansões. Isso, porém, é uma faca de dois gumes. Ter um mercado interno enorme é uma vantagem incrível, mas também pode nos limitar se ficarmos presos à ideia de operar apenas localmente. Temos que ter essa visão global desde o início. A Índia, a China e os Estados Unidos têm grandes mercados, mas estão constantemente buscando expansão internacional. E o Brasil deveria fazer o mesmo em termos de inovação. Temos empresas de tecnologia extremamente competitivas, que podem brigar de igual para igual em qualquer lugar do mundo, principalmente quando falamos de serviços financeiros.

Serve de exemplo a empresa de pagamento sueca Klarna, que levantou um total de 4 bilhões de dólares em rodadas de investimento desde 2005. O seu diferencial? Nas palavras da própria empresa, “Buy now, pay later”, ou, pra ser mais claro, permitir que e-commerces ofereçam pagamento em até 4 parcelas. Nossos amigos gringos não têm ciência do conceito brasileiro das 12x sem juros no cartão de crédito ou do carnê das Casas Bahia.

Algo que reparei nos Estados Unidos e na cultura de startups em geral, que realmente acho que deveríamos pensar bastante sobre, é como o fracasso de uma empresa, desde que não envolva fraude ou comportamento criminoso, não é visto como um estigma ou algo para se envergonhar. Pelo contrário, é considerado uma oportunidade de aprendizado valiosa. O famoso mantra "fail fast, fail often" reflete essa mentalidade: quanto mais rápido você falhar, mais cedo poderá aprender e ajustar sua estratégia. Além disso, o fato de que a falência de uma empresa não costuma afetar diretamente a riqueza pessoal do fundador, graças à estrutura de proteção legal e financeira, encoraja uma cultura de maior tomada de riscos. Empreendedores podem se lançar em novos projetos sem medo de perder tudo, o que impulsiona a inovação e a ousadia no ecossistema. Essa abordagem é algo que ainda estamos desenvolvendo no Brasil, onde o fracasso muitas vezes carrega um peso social e financeiro muito maior.

O empreendedor brasileiro não é pior, e muitas vezes é até melhor do que o europeu ou o americano. Temos criatividade, adaptabilidade e uma resiliência que poucos conseguem igualar. O que falta? Uma infraestrutura que nos apoie melhor, e uma mentalidade global. Mas, de resto, estamos prontos para competir no cenário global de startups. E quem sabe, em alguns anos, ao invés de olharmos para fora com tanta admiração, outros países estarão olhando para o Brasil como o próximo grande centro de inovação.

Leandro Navatta, formado em Sistemas da Informação pela Universidade de São Paulo (USP), é mentor na FGV Ventures, aceleradora de startups da Fundação Getúlio Vargas (FGV), e na Associação Brasileira de Startups.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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