• Carregando...
Policiais militares de São Paulo: Constituição garante a liberdade de expressão.
Policiais militares de São Paulo: Constituição garante a liberdade de expressão.| Foto: Arquivo

Até antes de 1988 os militares, federais ou estaduais, não tinham direitos eleitorais completos. A Constituição de 1988 foi a única no Brasil que deu direito ao voto aos militares, com exceção aos conscritos das Forças Armadas (artigo 14, §2.º). Passado o período de governo militar, o retorno à democracia abriu as portas diretamente para a esquerda, e tudo o que se associava aos militares foi considerado “extrema-direita”; isso afastou o Brasil de conceitos sólidos de liberalismo e conservadorismo, deixando uma hegemonia socialista e “progressista” chegar ao poder. Com isso, os militares ficaram praticamente fora do jogo político da nação.

Com o passar do tempo as coisas foram mudando; devido ao aumento da criminalidade (chegamos a ultrapassar 60 mil homicídios em 2018) e também aos crescentes casos de corrupção, pessoas ligadas à área de segurança, como policiais, juízes e membros do Ministério Público, começaram aos poucos a galgar posições no Legislativo e no Executivo. Até então, era apenas uma pedra incômoda no sapato da velha política, pois eles ainda mandavam no jogo por completo. Contudo, um ponto fora da curva surgiu, o inimaginável aconteceu: um capitão do Exército, visto como caricato pela mídia, chegou à Presidência da República, e, com ele, levou outros do mesmo seguimento. Isso o sistema não poderia aceitar.

Como uma criança mimada, que só é aceita no time por ser dona da bola, autoridades de diversas áreas, percebendo que as coisas realmente mudaram, começaram a se articular para derrubar o presidente. O ataque da mídia, que agora não recebia infindável verba governamental, era a maior arma da oposição. Artistas e intelectuais, outrora financiados pelo governo, juntaram-se à tropa de choque.

O presidente, sem partido, não estava completamente isolado. Entre seus apoiadores, contava com a nova mídia: As redes sociais. A princípio mais democráticas e independentes. Assim como nos EUA, essas redes foram vistas como um grande entrave ao velho esquema e as armas se voltaram para censurá-las. O país estava aparelhado após décadas sob o comando de outra ideologia; então, ataques surgiam de todos os lados. O presidente, ainda assim, contava com muito apoio popular, sendo o único caso de um governo em vigência capaz de mobilizar constantes manifestações a seu favor. Esse era um problema enorme para a oposição que, junto com a mídia, acusava tais manifestações de serem “antidemocráticas”, de pedirem intervenção militar, de fazer aglomeração durante a pandemia; até mesmo evitavam mostrar o número enorme de pessoas que participavam dessas manifestações pacíficas.

Tardiamente, a oposição apontou as armas para o que consideraram seu novo inimigo: os militares das Forças Armadas e das polícias. Esses somavam um exército de eleitores e muitos eram ainda formadores de opinião. Exército, Marinha, Aeronáutica e as Polícias Militares, em sua maioria, pareciam simpáticos ao governo federal. E era possível, ainda, incluir boa parte das polícias civis, guardas municipais, agentes penitenciários e até mesmo candidatos a essas profissões. O canhão, então incapaz de atingir totalmente as redes sociais e o povo, voltou-se contra os militares, colocando também no alvo os policiais e até mesmo os juízes e o MP. Esses últimos, graças ao medo de Sergio Moro e Deltan Dallagnol ficarem fortalecidos como candidatos a algum cargo eletivo.

Em dado momento houve forte repressão contra manifestações de militares, com temor em relação ao chamado para o 7 de setembro, um dia tradicional de comemoração da independência, da pátria e do civismo. Em seguida, veio a ameaça quanto aos posicionamentos em redes sociais e grupos de WhatsApp. Como um relâmpago, a deputada Margarete Coelho (PP-PI), apoiada pela oposição e integrantes do “Centrão”, incluiu na proposta do novo Código Eleitoral um dispositivo exigindo quarentena de cinco anos para policiais, militares, juízes e promotores poderem se candidatar às eleições. Defendia que isso traria um critério de igualdade (?!?). Essas não foram as únicas alterações de arrepiar: outras pregam verdadeira impunidade a alguns crimes eleitorais.

Os dispositivos foram derrubados, entretanto, após uma articulação envolvendo o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o Centrão, com apoio dos partidos de oposição, que em uma manobra regimental reinseriram a quarentena, agora de quatro anos e válida a partir de 2026.

Essas restrições acompanham a narrativa de parte da grande imprensa e de políticos de oposição, para os quais policiais militares estariam propensos a apoiar um golpe de Bolsonaro. Oras, policias militares são instituições de Estado, não de governo; ainda assim, possuem mecanismos que fazem seus principais comandantes estarem alinhados com a política de governo (estadual). A tropa segue disciplina rígida e está ciente de que atos de insubordinação são passiveis de duras penas.

Uma analise minimamente séria chegaria à conclusão de que, apesar de diversos candidatos a governador sempre usarem o manto de defensores da segurança pública, prometerem melhorias aos policiais e, muitas vezes após assumirem o cargo, utilizarem as polícias como propaganda, pela primeira vez os policiais militares se sentiram representados – não pelos governadores, mas sim pelo presidente da República.

Somado a isso, somente nos últimos anos os militares e policiais tomaram consciência ideológica, e o que antes eram votos dispersos ficaram direcionados, dando à classe grande representatividade nas urnas e incomodando quem não recebe mais esses votos. Entre 2010 a 2018, de acordo com o Instituto Sou da Paz, o número de policiais e militares eleitos como deputados federais aumentou 950%, sendo que oito em cada dez deles disputaram o pleito por partidos de direita ou centro-direita, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Nossa democracia não atende aos anseios do povo, mas aos do sistema. Políticos que estão no poder há décadas sucederam seus pais e colocaram seus filhos. O sistema eleitoral atual leva ao poder candidatos com votos insuficientes, o que não ocorreria caso adotássemos o voto distrital. Pela primeira vez, nas últimas eleições houve uma verdadeira alteração das cadeiras, justamente devido às redes sociais que viabilizaram eleições com baixo custo e sem a ajuda do bilionário Fundão eleitoral. Essa foi a verdadeira forma de igualar minimamente as condições, dando a oportunidade de renovação.

Colocaram mordaças nos militares, impedindo a possibilidade de emitirem suas opiniões e posições ideológicas; agora querem colocar algemas.

Davidson Abreu, bacharel em Ciências Sociais e Jurídicas, é oficial da Polícia Militar de São Paulo, professor, escritor e palestrante, e autor de “Tolerância Zero”. As opiniões expostas no artigo são unicamente do autor, não necessariamente as da instituição à qual pertence.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]