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As cenas de violência ocorridas em São Paulo recentemente, atingindo outros estados da federação, chocaram a sociedade brasileira, espalhando o medo e a insegurança.

A maioria das análises sobre os lamentáveis acontecimentos indica como solução o aumento da repressão policial. Prega a compra de mais armamentos para equipar as polícias e a construção de mais presídios de segurança máxima. Porém essas medidas são paliativas e não resolvem o problema por não atingirem suas raízes.

Para entender a violência, é necessário uma análise de pelo menos três aspectos:

1) A questão econômica. A marginalidade e a criminalidade tem seu caldo de cultura no desemprego, na fome, na miséria, na exclusão social de milhões de brasileiros.

Em última instância, a responsabilidade maior é do Estado e dos governos, que ao longo de muitas décadas têm mantido uma política, em nome do combate à inflação, impede o crescimento econômico, a geração de emprego e renda. Isto leva os desempregados a buscarem sua sobrevivência na criminalidade, criando uma espiral incontrolável da violência. Políticas compensatórias (bolsas de até R$ 70,00 por mês por família) podem minimizar o problema, mas não resolvem. Manter as pessoas com esse mínimo de recurso financeiro, sem uma ocupação, não impede a criminalidade.

O agravamento do desemprego também é de responsabilidade dos governos, que dão incentivos e estímulos tributários às empresas, que em nome da competitividade adotam tecnologias altamente poupadoras de força de trabalho, mas esses mesmos governos não exigem, em contrapartida, das empresas, a adoção de tecnologias, que incorporem mais mão-de-obra. A agricultura também recebe financiamentos dos bancos estatais, a juros baixos, para aquisição de maquinaria agrícola para produtos de exportação, que eliminam milhares de postos de trabalho no campo. Esses trabalhadores expulsos do campo vêm engrossar a população urbana nas periferias das médias e grandes cidades, nas regiões metropolitanas, agravando o desemprego estrutural e aumentando a criminalidade.

2) O conservadorismo das elites. As elites brasileiras são extremamente conservadoras e desenvolveram ao longo de séculos um espírito de acumulação patrimonial e financeira altamente concentradora, criando forte resistência à distribuição de renda. Basta ver o lucro dos bancos no último ano, chegando a R$ 18,8 bilhões de lucro líquido e somente com a cobrança de serviços e taxas bancárias cobriram sua folha de pagamento. Os banqueiros, na mesa de negociação, se negam a repor a inflação nos salários dos bancários e chegam ao cúmulo de quererem rever conquistas das convenções coletivas dos anos anteriores. Cada vez mais os bancos se utilizam dos serviços precarizados como o dos estagiários, que não têm direito algum e fazem os serviços dos bancários com um mísero rendimento. Adotam tecnologias das mais avançadas para pouparem empregos e exploram os correntistas, que fazem trabalho gratuito aos bancos, quando operam os caixas eletrônicos ou fazem operações bancárias pela internet. E tudo isso ocorre sem qualquer intervenção do Estado para deter essa exploração; pelo contrário, o Estado estimula essas práticas ao adotar uma política de juros altos para beneficiar os bancos nas transações de títulos do tesouro nacional. E para os correntistas, que aplicam seu dinheiro, os bancos pagam um juro vergonhoso.

A denúncia do conservadorismo das elites foi feita pelo governador de São Paulo, Cláudio Lembo, representante dessa mesma elite, ao afirmar que a burguesia é muito farisaica quando pede mais segurança, sendo ela mesma, pelo seu espírito mesquinho, causadora do caos social ao pagar baixos salários a seus empregados. E essa burguesia, para se proteger dessa situação, vai se esconder em condomínios de luxo, considerando-os seguros. Gastam cada vez mais em segurança, em carros blindados e vivem como verdadeiros presidiários e com muito medo.

3) A conivência do Estado. O crime organizado chegou a tal grau de sofisticação e estratégia de ação, que dominou 43 presídios somente em São Paulo. Isto porque o Estado, como detentor da força, não consegue controlar as ações do narcotráfico. O crime organizado se constituiu em uma força paralela à do Estado, a tal ponto que se obriga a fazer concessões para conseguir uma trégua temporária com a criminalidade.

Para que volte a reinar o mínimo de paz em nossas cidades e em nossas famílias, é necessário enfrentar o grave problema da péssima distribuição de renda desse país, que detém o título de uma das piores concentrações de renda do planeta. E isto se faz com a volta do crescimento econômico, uma política de tributação sobre as grandes fortunas para que o Estado readquira sua capacidade orçamentária para desenvolver políticas públicas, que atuem no sentido da redistribuição efetiva da riqueza nacional.

E-mail: l.lafa@terra.com.br

Lafaiete Neves é doutor em Economia pela UFPR, professor aposentado da UFPR e professor dos Cursos de Economia e Serviço Social da PUCPR.

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