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No início deste ano, uma informação inusitada foi noticiada pelo jornal Gazeta do Povo: chineses da localidade de Fumin pintaram uma montanha de verde a fim de dar uma solução ambiental à área onde funcionava uma pedreira. Para todos os leitores, fica óbvio o equívoco em que se insere a empreitada oriental. Mas só os chineses andam por aí pintando montanhas? Certamente não. Uma enorme fatia de investimentos dirigidos à conservação da natureza em nosso país segue a mesma linha, embora isso seja pouco perceptível para a maioria da população.

A primeira razão para os equívocos em ações de conservação da natureza é o aspecto técnico. Por se tratar de uma ciência recente e ainda não suficientemente reconhecida, um contingente impressionante de não qualificados se apresenta para opinar e executar. Com eles, estão os partidários do desenvolvimento a qualquer custo, contra a proposta da conservação ou apoiando iniciativas de pouca efetividade, sem assumir maiores responsabilidades. Destituída de melhor conceituação, a sociedade fica com o dito pelo não dito.

Do setor público ao privado, nas instâncias que atuam com conservação da natureza são freqüentes duas premissas. A primeira é o atendimento a demandas do desenvolvimento em grande escala, nas quais o uso de terras é vastíssimo e baseado em monoculturas. Nesse caso, a justificativa é de que a ampliação será "sustentável", embora não existam, na maioria dos casos, parâmetros de limite. Essa postura diminui, ano após ano, as reservas naturais no território brasileiro, em favor das atividades agropecuárias e de outros empreendimentos de infra-estrutura.

Numa segunda vertente, há uma força cada vez mais organizada de pessoas que demandam terras para se estabelecer no campo, também de maneira "sustentável". Nesse caso, uma das estratégias de sucesso é a invasão de áreas ainda conservadas. Após a ocupação, esses movimentos têm suas necessidades financeiras de curto prazo resolvidas com a madeira e a caça, exploradas sem qualquer fiscalização, em um desrespeito inconteste à legislação.

Esses dois discursos de "sustentabilidade" simplesmente não se sustentam. Tais iniciativas, contudo, têm publicidade e garantem assim outro objetivo: manter a sociedade na escuridão. Por isso, não acreditar em tudo que é anunciado como "verdinho" é uma boa medida para não continuar enganado.

Vamos prestar atenção em:

1. Órgãos ambientais mais preocupados com a expansão territorial do negócio da grande propriedade e com o apoio a soluções insensatas para demandas sociais. Ambas as questões já são atendidas por outras instâncias e estão fora da missão de um órgão ambiental, o único capaz de estabelecer e direcionar políticas para a conservação da natureza;

2. Projetos conservacionistas criados sem planejamentos estratégicos prévios. Ações desconexas e resultados duvidosos são utilizados como forma de exposição, divulgados sem indicadores de resultado e sem o compromisso de mudanças concretas.

Exceções existem. Dentro e fora dos governos, atividades extraordinárias podem ser elencadas como capazes de mudar o cenário desolador da conservação da natureza em nosso país. No entanto, elas se mantêm à margem, fora das políticas públicas atuais, sem sinais de mudanças no curto prazo.

Rachar instituições – como no caso Ibamo/Inbio –, sem a existência de uma estratégia que garanta o fortalecimento das ações conservacionistas no Brasil, é um dos exemplos que deveriam ser mais debatidos. Aos inúmeros "pintores de montanhas", pede-se uma reflexão. E, quem sabe, as Semanas do Meio Ambiente do futuro não serão tão desanimadoras quanto esta.

Clovis Ricardo Schrappe Borges é diretor executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS). clovis@spvs.org.br – www.spvs.org.br

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