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Há que se cuidar com o pânico gerado num momento como este para que medidas tomadas não sejam imediatistas e pautadas no medo e na insegurança

Este artigo se propõe a gerar reflexões, e se baseia em suposições de um caso que precisa ser amplamente investigado e para o qual poucas informações confirmadas se têm até o momento. Não busca explicações simplistas no calor do momento, e repudia preconceitos midiatizados que reforçam uma cultura do terror.

A tragédia sem precedentes no Brasil deixa a todos perplexos.

Tamanha violência interrompendo caminhos, estraçalhando famílias.

Diante de tanta tristeza, muitas perguntas, algumas reflexões, silêncio. É necessário o silêncio, em memória das vítimas e a fim de que os possíveis apontamentos de novos rumos sejam tomados sabiamente. No momento da dor e da revolta, decisões tomadas nem sempre são as mais efetivas. É preciso calma para se buscar a paz e a justiça.

Uma necessária lembrança: ao pensarmos no local da tragédia, o que houve é uma exceção. As escolas no Brasil enfrentam inúmeros problemas, sim, e para esses problemas há muito o que se pode fazer.

Mas há que se cuidar com o pânico gerado num momento como este para que medidas tomadas não sejam imediatistas e pautadas no medo e na insegurança. Quando acuados, movidos pelo medo, podemos não atentar para aspectos cruciais.

O local da tragédia suscita a questão: como educação e violência se entrelaçam? Um ambiente de crianças e adolescentes que deveria ser, a priori, tomado por momentos de descobertas, curiosidades, conhecimento, alegrias, amizade, companheirismo. A escola como um lugar de busca de conhecimento produzido pela humanidade e compartilhado para as novas gerações, e, num processo que se retroalimenta, a produção de novos conhecimentos. A escola como um espaço para o exercício da cidadania em sua mais plena forma. E para alcançar esse objetivo, essa instituição deve ser acolhedora, inclusiva, segura.

A escola é também ambiente onde inúmeras relações humanas se constituem e, como em qualquer ambiente social, essas relações experienciam os mais diversos sentidos. E é um dos ambientes mais propícios para que se dê o aprendizado de valores que norteiam uma sociedade pacífica como o respeito, a ética, a justiça. Mas como se constrói essa sociedade pacífica? Como se dá o aprendizado desses valores?

Buscando-se referências, exemplos, modelos. Essa é uma das principais formas de aprendermos a conviver em sociedade. As crianças e jovens estão sempre se espelhando nos adultos à sua volta. Responsáveis pela educação por meio de ensinamentos e, principalmente, de atitudes é, para nós, pais, mães, educadores, policiais, políticos, autoridades, que devemos direcionar o nosso olhar. Estamos sendo referência a esses jovens de exemplos éticos, primamos pelo diálogo, buscamos a justiça e trabalhamos em prol do bem comum ou valorizamos nossos próprios interesses, priorizando o prazer imediato e bem estar individual? Estamos sendo pacíficos em nosso cotidiano, com aqueles com quem nos relacionamos ou muitas vezes agimos de forma violenta por meio da omissão, humilhação, discriminação, palavras duras ou até mesmo a rejeição?

Em tempo: essa tragédia poderia ter sido evitada? Se olharmos para o jovem agressor, as informações apontadas em sua direção traduzem uma realidade de alguém com problemas psicológicos e relacionais. Um jovem que pouco falava e quase não tinha amigos.

E que teve acesso a armas e munição. De todos esses aspectos, em quais deles é realmente possível intervir? Ações que promovam o diálogo, a amizade, a inclusão, a afetividade, a identificação são sempre eficazes no sentido de prevenir violências e fortalecer comportamentos pacíficos e tais ações têm sido tomadas e podem ser fortalecidas nas instituições escolares. O fácil acesso a armas e munição no Brasil mostra a deficiência de nossas políticas de segurança pública.

A experiência que tenho tido ao longo de dez anos com as mais diversas escolas de Curitiba e região metropolitana, acompanhando as pesquisas produzidas no Brasil e no mundo na área da violência escolar, mostra para mim que há muito o que se pode fazer na construção da paz por intermédio das escolas. Entendendo que a paz não exclui o conflito das relações humanas; que o conflito, enquanto divergência é norteador de uma cultura heterônoma e faz parte de um ambiente pacífico; entendendo que a paz não é ausência de atitude, e sim exige ações efetivas e contundentes; entendendo que crianças, adolescentes, jovens e, por que não, também nós os adultos estamos ávidos por referências pacíficas que nos norteiem num processo educativo que nos indique como viver neste mundo tão desafiador, concluo que é urgente e necessário que cada um de nós se perceba agentes na construção dessa cultura da paz.

Adriana Araújo Bini é coordenadora-técnica do Projeto Não-Violência.

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