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Acabamos de ver um novo suplente de senador assumir o cargo sem ter se apresentado como candidato para receber votos. É esse realmente um caso que deveria envergonhar a classe política

A sociedade brasileira vem, há anos, sofrendo com a falta de uma reforma política que realmente pudesse justificar as enormes benesses que a classe política recebe da coletividade que a sustenta, através de uma carga tributária que chega às raias da insanidade, tudo para gozar do privilégio de se dizer democrática.

Como puderam as coisas chegar a tais níveis de arbítrio e dominação ideológica? A resposta só poderá ser encontrada nos baixos níveis de consciência social que sempre foram a marca registrada de nossa cultura, desde os tempos do Brasil Colônia. Pois o Estado sempre foi o pai de todos, o detentor de todas as prerrogativas, nesse torrão imenso de nossa tropicalidade.

É fato corriqueiro ouvir-se queixas da classe política com relação às críticas dos meios de comunicação em geral, sempre a denunciar suas falhas ou seus comportamentos indignos, por motivos inconfessáveis e que geralmente comprometem a honorabilidade dos assuntos públicos. Pois a sociedade deve se sentir agradecida por ainda poder contar com uma imprensa livre e que exerce as funções que deveriam ser de todos os cidadãos, ou seja, um acompanhamento rigoroso quanto ao desempenho dos candidatos que elegemos.

Ainda agora, diante de uma nova legislatura, eis que deputados e senadores apresentam-se empenhados em patrocinar uma nova reforma política, urgentemente aguardada como necessária para modificar distorções graves no processo de escolha de nossos representantes. Pois bem. O mínimo que se poderia esperar seria a proposição de temas fundamentais que pudessem alterar nossos processos eleitorais submissos à estrutura dos partidos, sem escolhas prévias.

Ao contrário, o conteúdo das propostas já aprovadas nas diversas comissões legislativas podem nos conduzir a novas decepções, pela recusa contumaz em não discutir temas essenciais, como o voto voluntário, as candidaturas autônomas, o voto distrital, o fim da possibilidade de senadores e deputados serem eleitos na carona de outros muito bem votados (caso Tiririca), ou sem um único voto, como ocorreu agora com o suplente da senadora Gleisi Hoffmann.

A querela jurídica referente à vigência da lei de iniciativa popular, conhecida com Ficha Limpa, que impede a efetivação de candidatos e eleitos com problemas de corrupção e processos criminais, apesar das dificuldades referentes à sua efetivação, nos dá uma amostra de como é importante a mobilização popular quando se trata de propor alterações no processo político. A mobilização mostra a contrariedade dos próprios votantes.

Pois é disso que o Brasil precisa. Acabamos de ver um novo suplente de senador assumir o cargo sem ter se apresentado como candidato para receber votos – e investigado pela nomeação da própria mãe como funcionária pública. É esse realmente um caso que deveria envergonhar a classe política e que contribui, como mais um caso lamentável, para o aparecimento de personagens políticos sem um mínimo de respaldo popular, sem o mínimo de qualificações que pudessem dignificar nosso parlamento.

O aperfeiçoamento de nossas vivências democráticas só tem um único caminho a perseguir: a melhoria acentuada dos níveis de nossa massa crítica coletiva, uma consciência de cidadania que não esteja baseada apenas na indiferença ou nos interesses egoístas, mas sinta que as atividades políticas deverão ser exercidas por pessoas escolhidas em função de suas qualidades e bons exemplos.

Antonio Celso Mendes, mestre e doutor em Direito, é professor da PUCPR e pertence à Academia Brasileira de Ciências Morais e Políticas, com sede no Rio de Janeiro.

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