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Nos termos do artigo 196 da Constituição da República, a saúde é um Direito de todos e dever do Estado. Por intermédio desta garantia, tutela-se o direito à vida, cuja proeminência e importância valorativa se sobrepõe a todos os demais direitos do homem (educação, moradia, patrimônio, etc.).

Infelizmente, entretanto, a presidência do Egrégio Tribunal de Justiça tem olvidado desta garantia fundamental, expressamente consagrada na Constituição Federal, resguardando as finanças do Estado em detrimento da vida humana, em evidente inversão valorativa e teleológica (o Estado serve o homem).

Com efeito, a Promotoria de Defesa da Saúde Pública da Comarca de Londrina tem ingressado com várias ações civis públicas, pleiteando, liminarmente, a concessão de remédios fundamentais à sobrevivência digna dos pacientes, muitos deles em iminente perigo de vida. Os juízes de primeira instância, bem como os desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado, sensíveis à necessária e eficaz prestação jurisdicional, tem concedido a medida liminar, já que a saúde é um direito fundamental que deve ser resguardado.

Entretanto, a presidência do Tribunal de Justiça, invocando diploma legal que deve ser utilizado em caráter excepcional (Lei n.º 8437/92), tem suspendido a medida liminar concedida, fundado na cláusula genérica de "risco de lesão à ordem pública e à ordem econômica", cujos efeitos da suspensão se estenderão até o trânsito em julgado da sentença (término de todos os recursos que, diga-se de passagem neste país, demoram muito). Até lá, os pacientes estarão vivos? Quem deverá responder pela negação deste direito fundamental?

Não se olvida que os recursos públicos são finitos e escassos frente às infindáveis necessidades humanas (reserva do possível). A tutela das finanças públicas, entretanto, não pode ser vislumbrada como um fim em si mesmo, já que o Estado existe para satisfazer as necessidades vitais do homem – e não ao contrário.

Por esta razão, há que se priorizar, no amplo espectro das necessidades humanas, aquela que se avizinha da própria existência do homem, diante das quais não pode o Estado deixar de socorrer, ainda que precise reduzir dispêndios em outras áreas de sua intervenção.

Assim, a reserva do possível não pode ser alegada para eximir o Estado de realizar as necessidades fundamentais do homem (vida, saúde), ainda que necessite criar créditos suplementares ou remanejar outras verbas orçamentárias, incumbindo-se ao Poder Judiciário determinar o cumprimento da ordem valorativa estabelecida no texto constitucional. Pode-se, então, cancelar rubricas orçamentárias destinadas à publicidade estatal, para satisfazer o direito à saúde, indispensável à sobrevivência da espécie humana.

O Poder Judiciário Paranaense (leia-se: presidência) não só pode como deve determinar ao Executivo, no exercício da jurisdição, que realize as prestações públicas fundamentais estabelecidas na Constituição, para, a um só tempo, salvaguardar lesão ou ameaça de direito e impedir que o cidadão agonize à espera de um medicamento que lhe proporcione existência digna.

Renato de Lima Castro é professor de Direito Penal e promotor de Justiça do Ministério Público do Paraná.

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