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Em artigo anterior analisei as razões que levam os eleitores ao desencanto com a política. Entendo que o desencanto pode levar a uma saída individualista de protesto do eleitor no dia 1.º de outubro, o que, sem apresentar uma alternativa de enfrentamento dessa situação, pode ser um ato sem conseqüência política. Isso pode fragilizar o resultado das CPIs e as denúncias na mídia de corrupção envolvendo autoridades públicas e membros de partidos políticos, que demonstram não se intimidar, pois continuam reincidindo nessas práticas condenáveis, como revela o escândalo recente do dossiê. Mais do que isso, as atitudes dos envolvidos em denúncias e dos mandatários maiores da nação têm sido as mais díspares. No governo FHC, em 1998, com muitas denúncias na mídia sobre corrupção, como a da compra de votos para a aprovação da emenda da reeleição, o secretário-geral da Presidência, Eduardo Jorge, anunciou publicamente seu pedido de afastamento do governo, sem retorno, para se dedicar à coordenação da campanha pela reeleição de FHC. No governo Lula, também os envolvidos em denúncias de corrupção, membros do seu primeiro escalão afirmaram que pediram afastamento dos cargos. O presidente Lula em vários pronunciamentos tem afirmado que os afastou até a apuração dos fatos, sem pré-julgamento. Essa dissimulação só dificulta o resgate da política.

A superação desta triste realidade e o fortalecimento da democracia, como caminho para a volta da confiança na política como solução dos problemas da coletividade, passa necessariamente por uma profunda reforma política com implicação no financiamento de campanhas eleitorais.

A reforma política se impõe diante da desmoralização dos partidos e dos políticos. Isto porque os políticos, na sua maioria, usam os partidos como legenda de aluguel. Após eleitos, trocam de partido como se troca de camisa, com um agravante: buscando ganhos privados, ou seja, vendendo seus mandatos conforme denúncias amplamente divulgadas na mídia. Outro fato grave que destrói os partidos são as alianças espúrias, com o fim meramente eleitoral, abandonando posturas ideológicas e programáticas. Quem acompanha as eleições nesse país fica atônito com as contradições de determinadas alianças. Como é possível explicar a aliança do PPS como o PFL? É absolutamente inexplicável que um partido conservador (PFL) se alie a um partido que tem origem na esquerda, o PPS, que é oriundo do PCB. E O PT se aliando com o PL e o PTB, o que dizer? E o PMDB, que continua sendo uma frente dividida em várias partes, se aliando em um lugar com o PT e em outro com o PSDB e este também fazendo as alianças mais contraditórias em vários estados. Enfim, o que temos é uma mistura partidária que só confunde o eleitor e desgasta a política. A fragilidade dos partidos é tamanha que os eleitos para o legislativo ou para o executivo só usam os partidos para as eleições. Depois de eleitos, os partidos não têm qualquer controle sobre os mandatos, sequer podem punir com a perda de mandato aqueles que mudam de partido. Então, se quisermos construir uma sólida democracia em nosso país, temos que criar um amplo movimento que acabe com essa caricatura de partidos políticos. Temos que exigir que os partidos tenham princípios ideológicos, éticos e programáticos.

Outra questão central nesse debate é o financiamento das campanhas eleitorais. Não é possível aceitar a disparidade de recursos financeiros entre candidatos. Há aqueles que não têm dinheiro nem para os santinhos de propaganda eleitoral e aqueles que têm frotas de veículos, centenas de cabos eleitorais pagos. Onde está a igualdade de condições para uma disputa democrática? Tem que haver uma coibição desses gastos descontrolados, com recursos suspeitos de caixa 2. O financiamento público de campanha pode ser uma solução. Precisamos de uma rígida legislação eleitoral, que proíba que o candidato seja vendido para o eleitor como se fosse um sabonete. Bem cheiroso, bem embalado e com uma farta e rica propaganda para convencer o eleitor a elegê-lo como o melhor produto no mercado eleitoral. Não podemos admitir que a propaganda eleitoral e o marketing substituam a política. A continuar assim, só teremos como resultado o estelionato eleitoral, pois os eleitos, assumindo seus mandatos, passam a fazer o que lhes interessa, traindo todas as promessas de campanha. Entendo que não há democracia forte sem partidos solidamente implantados na sociedade, em que os cidadãos passem a escolher seus candidatos a partir de uma clareza ideológica e programática, construída pela ampla participação dos eleitores nas instâncias de decisão dos partidos e no controle dos mandatos eletivos. Só assim será possível o resgate da política.

Lafaiete Neves é doutor em economia pela UFPR, professor aposentado da UFPR e professor dos cursos de Economia e Serviço Social da PUCPR.

E-mail: l.lafa@terra.com.br

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