• Carregando...

Todos nós queremos ajudar as gestantes? Espero que sim!

Ajudo crianças a nascer há 30 anos. E fico assustado com algumas posições adotadas e com o andamento do projeto que ora virou lei pela Câmara de Vereadores de Curitiba, sem ouvir a especialidade médica. Fui procurado como médico por repórteres da Gazeta do Povo, e citado na reportagem que fez referência ao tema.

Leia a opinião completa de José Jacyr Leal Júnior, obstetra há 30 anos, é integrante e ex-diretor da Comissão de Obstetrícia da Sociedade de Obstetrícia e Ginecologia do Paraná e da Associação Médica do Paraná.

O corpo recebe o sinal; é chegada a hora. A mulher sente seu corpo se abrindo a cada contração, imerso em ondas de calor, é pura energia em movimento. Ela pede por carinho, por colo, busca o repouso no intervalo entre o fluxo das contrações. Mexe o quadril, acocora-se, emite sons desconhecidos. Pede por um gole d'água. Muitas horas se passam e os cabelos ficam bagunçados; os olhos fitam o infinito. E, de repente, com força, o corpo em harmonia empurra o bebê, com gritos, com entrega, são os ruídos da alma. Suavemente o bebê vai saindo, sendo abraçado pelo corpo quente de sua mãe. E, então, nasce!

Com doçura, é levado direto para o peito, onde pode, finalmente, sentir o aroma do néctar do amor em minutos de eternidade. Os hormônios dançam para perpetuar a vida e o dom de amar. A mulher, feliz e transformada, sente-se plena de força e coragem. O bebê, seguro e protegido, em seu primeiro olhar enxergou uma nuvem de amor e paz.

Deveria ser sempre assim, delicado e encantador. Mas, no Brasil, uma em cada quatro mulheres sofre violência em um dos momentos mais especiais de sua vida: o nascimento de um filho. A história delas, apesar da alegria da chegada de um bebê, é minada de dor, desrespeito e sofrimento.

Em vez de paciência, encontram pressa. Em vez de acolhimento, encontram hostilidade. No lugar do respeito, violência.

A violência obstétrica é uma forma de violência contra a mulher, sutil e silenciosa, que acontece dentro das instituições que prestam serviço obstétrico, podendo ser cometida por qualquer sujeito, seja a enfermeira, o porteiro ou o médico. São práticas e rotinas exercidas pelos profissionais que violam os direitos da mulher e sua autonomia, desrespeitam sua inteligência e sua capacidade de parir, e atrapalham a boa evolução de seu processo de parto.

Falas como "na hora de fazer não gritou", ou ações como exames de toque abusivos, proibição da livre movimentação, procedimentos sem informação e consentimento da mulher como o corte no períneo, separação de mãe e bebê, são exemplos de rotinas violentas que são naturalizadas nas instituições de saúde.

Embora muitas mulheres sofram violência obstétrica todos os dias, poucas dão voz ao seu sofrimento por medo, opressão e por estarem vivenciando um momento especial, não querendo que a marca da violência seja a lembrança do nascimento do seu filho. Outras, talvez a maioria, nem sequer sabem que o desconforto, a dor e a angústia que vivenciaram não eram do parto em si, mas eram, na verdade, fruto das condutas violentas de quem deveria cuidar e proteger.

Para além da satisfação com o processo de parir e nascer, a violência obstétrica é também responsável pelos altos índices de mortes maternas e neonatais.

É preciso dar voz às mulheres e devolver a elas o domínio sobre seus corpos e o protagonismo de seus partos. A ação deve ser conjunta e contínua entre mulheres, profissionais e toda a sociedade.

Entendendo a importância do período ao redor do nascimento, podendo suas características determinar a visão de mundo do sujeito, fica claro que o respeito ao parto e ao nascimento é mais que uma mudança necessária para aumentar o sucesso obstétrico. Parir e nascer bem influencia toda a sociedade, uma vez que a capacidade de amar passa necessariamente pela sensação de ser amado e respeitado nos primeiros instantes de vida.

Assim, se queremos uma sociedade mais respeitosa e com menos violência, precisamos cuidar dos nascimentos, das mulheres e dos bebês com todo o amor e dedicação, para que a primeira impressão de mundo do bebê recém-nascido seja de paz e tranquilidade, fazendo-os crer que este mundo é bom, seguro e que vale a pena estar aqui.

Nitiananda Fuganti é doula, educadora materno-infantil, responsável pela Casa Mãe e coordenadora do Movimento pelo Bem Nascer em Curitiba.

Dê sua opinião

Você concorda com o autor do artigo? Deixe seu comentário e participe do debate.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]