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Ameaçando esquentar somente agora – tardiamente, portanto –, a campanha eleitoral, na realidade, não ganhou corpo e conteúdo, embora devesse ser palco onde as questões que preocupam o país são debatidas com seriedade, profundidade, candidatos formulam propostas e as intenções de voto são definidas com base nessa dialética.

Entre as muitas questões inquietantes, há o desemprego em massa, embora quando se analisa qualquer ponto logo se percebe inevitável ligação entre as problemáticas, remetendo a um termo comum: falta de planejamento, não por acaso, a maior falha do governo Lula.

Um ambiente de oportunidades só é possível em uma economia que cresce a todo vapor; e, para isso, ela precisa funcionar livre de amarras burocráticas, legais e fiscais, com carga tributária suportável, juros baixos, infra-estrutura, bons sistemas de transporte, mão-de-obra qualificada, logo, amplos investimentos em educação... Não é papel do Estado empregar diretamente, inchando a máquina, aumentando irresponsavelmente os gastos públicos, mas oferecer condições às atividades econômicas para que criem empregos.

Insere-se nesse contexto a crise da Volks, que ameaça deixar mais alguns milhares de brasileiros desempregados. Não escapa o tratamento diferenciado que as empresas do grupo e tantas outras multinacionais que se instalaram no país, nas últimas décadas, têm recebido. Tanto que, para evitar uma leva de demissões, na unidade de São Bernardo do Campo, o BNDES tenta barrar um empréstimo de quase R$ 500 milhões à montadora. Enquanto isso, micro e pequenas empresas, sem recursos, lutam para ter uma legislação incentivadora, vivem dificuldades angustiantes, dezenas de milhares estão inadimplentes com o fisco e vão aproveitar o Refis III para pôr a vida em dia. Pior: a maioria termina fechando as portas por incapacidade de sobreviver em um meio adverso.

Não faz sentido, na atual conjuntura mundial, uma postura governamental cubana ou boliviana de rejeitar o capital externo que vem agregar valores. Deve ser repelido sim o capital especulativo – aquele apenas interessado em colher os juros estratosféricos que o Comitê de Política Monetária aceita pagar e aquele atraído por facilidades, como carências e longos prazos no pagamento de impostos, sem compromisso com o social.

Claro que fatores globais afetam nossas exportações e estão balançando até as economias mais sólidas, como a norte-americana. Pela primeira vez, a indústria automobilística dos EUA mostrou sinais de sentir o avanço das concorrentes asiáticas. Todo o mundo capitalista, na verdade, está preocupado com a surpreendente capacidade, principalmente da China, de despejar todo tipo de produto no mercado, a preços inigualáveis, fabricado com mão-de-obra barata. Não menos importante a considerar é o avanço das tecnologias, e as montadoras estão entre as indústrias que mais absorvem automação, produzindo cada vez mais com cada vez menos mão-de-obra humana.

Em queda, porém, não estão apenas as exportações de veículos aqui produzidos, os da Volks e das outras montadoras, mas também as mercadorias dos setores têxtil, de calçados, químico, da siderurgia, da metalurgia, da agroindústria etc.

A crise da montadora, portanto, faz parte de uma crise maior em que o Estado é o principal responsável, por sua incapacidade de pensar a economia como um todo. O governo não tem feito corretamente a lição de casa, a começar pela política cambial equivocada que mantém o dólar desvalorizado. A própria Volks aponta esse fator como causa da reestruturação que prevê enxugamento de pessoal, não apenas em São Bernardo do Campo, mas nas suas cinco unidades do país. E, de imediato, se as regras do câmbio não mudarem, não há como evitar demissões em massa, infelizmente, em todos os setores.

Maurício Fernando Cunha Smijtink é contador, empresário da contabilidade e presidente do CRCPR.

mauricio@crcpr.org.br

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