• Carregando...

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo houve por bem reconhecer o poder o feto, desde o momento da concepção, ainda que desprovido de capacidade jurídica para pleitear judicialmente seus direitos. Na verdade, apesar do reconhecimento judicial da capacidade "ad causam" do feto, não houve o reconhecimento da "vida" nesse estágio da gravidez. E este sim é o grande debate que instiga a toda a comunidade jurídica. Quando se dá o início da vida?

O biodireito instiga os mais diferentes pontos de vista. Um posicionamento sobre qualquer assunto relativo à bioética/biodireito envolve, de um lado, uma pluralidade de argumentos embasados em princípios filosóficos, éticos e morais e, de outro, em fatores de natureza científica. O estudo do biodireito não pode aceitar posições fechadas, preconceitos e crenças imutáveis, até porque o desenvolvimento das ciências biomédicas é tão dinâmico que impõe desafios éticos difíceis de serem padronizados pela moral comum.

Com relação ao início da vida, a quase unanimidade dos biólogos garante não existir definição científica formal para ela. Há cientistas que sustentam não haver vida fora do útero. Portanto, embriões congelados, fertilizados "in vitro" não seriam caracterizados como seres vivos. Há outros que aplicam o critério para definir o momento da morte como sendo o adequado para definir o início da vida. A constatação da existência de atividade cerebral no feto seria, assim, o critério para o início da vida. Para um outro grupo, o momento do início da vida se daria na fecundação, enquanto outro defende a tese de que a vida se inicia somente quando o feto pode viver independente da mãe.

Há, ainda, critérios religiosos que vêm sendo alterados conforme os rumos filosóficos da história. Nos primeiros séculos, o abortamento até era aceito antes do momento da aquisição da alma. Nessa concepção, a infusão da alma não ocorria em fetos, mas tão somente quando a matéria estivesse suficientemente organizada para dar suporte à alma. Durante o período medieval, prevaleceu a teoria de São Tomás de Aquino, também no sentido da falta da alma em seres em formação. A alma racional, que daria ao homem o dom da inteligência, tornando-o "substância individual de natureza racional", não existiria na fase embrionária. Em 1869, o Papa Pio IX, ao adotar a encíclica "Apostólica Sedia", interrompeu a discussão do feto inanimado, ao declarar pecado o aborto em qualquer situação e em qualquer momento.

Não se pode esquecer a posição dos filósofos. Grande parte da escola aristotélica sustenta que a humanidade está presente desde a concepção, porque somente uma causa essencialmente humana explicaria o crescimento ordenado e contínuo dos conceitos para um ser completamente desenvolvido, que o faz um ser individual diferente, com identidade pessoal, antes do nascimento.

O tema, como se percebe, é amplo e instigante e a discussão se torna absolutamente necessária já que há vários assuntos polêmicos que dependem da caracterização do momento do início da vida, tais como o da manipulação de células embrionárias para pesquisas científicas, agora em evidência.

Somente com a definição legal do que é o início da vida, e vida digna, condutas poderão ser aplicadas de maneira segura, tais como a utilização para pesquisas terapêuticas dos embriões congelados, a antecipação de fetos anencefálicos, o aborto e a eutanásia.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]