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Carro, ao menos no Brasil, está no topo da lista dos sonhos de consumo de quase todos. É a liberdade de ir e vir, como diria Henry Ford, ao defender as vantagens do produto para o qual criou o sistema de produção em série. Hoje, talvez ele precisasse reavaliar essa idéia. Afinal, que sensação de liberdade tem alguém que fica preso em congestionamentos ou se arrasta lentamente pelo trânsito quando tudo o que mais quer é chegar em sua casa depois de um dia de trabalho?

É interessante observar que algumas questões cruciais deste início de século, como a sustentabilidade do desenvolvimento econômico frente à devastação ambiental em escala planetária, colocam em evidência questões como o aquecimento global, o assunto da moda. Mas, apesar da relação íntima desse tema com a cultura do automóvel, principalmente por conta do aspecto energético, não se observam mudanças de comportamento em relação à utilização desse meio de transporte.

O emprego de biocombustíveis é apontado por muitos como a solução para as elevadas emissões de gases causadores do efeito estufa, mas está longe de resolver o problema de forma satisfatória. Recentemente, o ambientalista Lester Brown, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo (2/07), alertou para a escalada de conflitos no campo, afirmando que haverá, com a produção de combustível a partir de grãos, uma disputa épica entre os 800 milhões de donos de carros e os 2 bilhões de pobres do planeta.

Mas é fácil alienar-se de tudo isso. Basta sentar-se em uma máquina poluidora de duas toneladas, iludir-se com uma pseudo-proteção oferecida pela armadura de aço e plástico equipada com vidros escuros, aparelhos de som, dvd e outros equipamentos que o distanciam ainda mais da realidade das ruas.

Na edição de 1.º de julho, uma reportagem da Gazeta do Povo apontou que Curitiba está muito próxima de ter uma frota de 1 milhão de veículos. Segundo a matéria, as pessoas rejeitam o transporte público por considerá-lo lento e ineficiente. Porém, no lugar de exigirem do governo municipal soluções de longo prazo e ambientalmente corretas, preferem comprar seus próprios veículos e assim circular pelo espaço público como se tivessem adquirido uma bolha móvel de espaço particular.

Só que o caos a que chegamos no trânsito nos obriga a questionar o papel do cidadão motorizado dentro da cidade. Com 1 milhão de carros, Curitiba se une a metrópoles como São Paulo, que apresentam graves problemas de mobilidade e que não têm políticas de incentivo ao uso maciço de transportes individuais não-poluentes.

A bicicleta se apresenta como uma solução barata, saudável, não-poluente e capaz de reduzir o barulho infernal desse milhão de carros, o mau cheiro, as doenças respiratórias causadas pela fumaça dos escapamentos e ainda as mortes, atropelamentos e acidentes que destroem vidas, famílias e oneram os cofres da saúde pública.

Antes de tudo, a bicicleta deve ser encarada como meio de transporte legítimo. Para quem acha que isso é um retrocesso, basta lembrar que a prefeitura de Paris, recentemente, passou a oferecer bicicletas gratuitamente a seus cidadãos como alternativa de transporte público.

Aqui não deveria ser diferente. O uso das bikes tem de ser estimulado por políticas ativas e dinâmicas que proporcionem a infra-estrutura necessária para que todos possam se sentir seguros pedalando pela cidade. Essas políticas não podem abrir mão de ciclo-faixas e ciclovias modernas, bem iluminadas, sinalizadas e que percorram a cidade inteira. Também são necessários bicicletários nos terminais de ônibus e nos estacionamentos de locais de grande circulação de pessoas, como shopping-centers e escolas; campanhas de estímulo para que motoristas deixem o carro em casa e sintam-se mais vivos e integrados à cidade, pedalando até o trabalho, exercitando-se e contribuindo para uma melhor qualidade de vida no espaço urbano; e campanhas de educação no trânsito baseadas na cultura da não-violência e da mobilidade limpa.

Goura Nataraj e Romeu de Bruns são integrantes do movimento Bicicletada, voltado à conscientização sobre meios de transporte ambientalmente corretos. www.bicicletada.org

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