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Às vezes pedem-me opinião sobre o amanhã da imprensa, e do jornal em particular, diante da realidade das mídias eletrônicas. Não tenho respostas prontas, adoto a dúvida metódica para analisar a questão, encontro e confronto pistas essenciais. A tendência é confirmar a "eternidade da jornal" (mídia impressa em geral), pois ele vai crescendo em credibilidade, mesmo que perdendo em tiragens. Fica com auditórios cada vez mais exigentes, qualificados, formadores de opinião. Carrega responsabilidades com o leitor que a web não atrai. E cresce também como fonte de referência da maioria dos outros veículos, sendo o incontestável gerador das grandes e sólidas pautas.

Não sou um pensador da área, mas alguém que sempre viveu dentro de jornal, e da mídia impressa em geral, aos longo de 47 anos de profissão. Posso até ser um razoável memorialista da imprensa no Paraná, a partir de 1960. Vi os primeiros dias da revolução da imprensa trazida ao Paraná pelos Diários Associados, com Adherbal Stresser, marco datado de 1956. Ali, na Rua José Loureiro, 111, onde hoje há um estacionamento, estabeleceu-se uma fronteira, delimitando o futuro da mídia identificado naquela escola. O primeiro passo foi implantar a diagramação, trazida por Benjamin Steiner, o argentino que vinha de experiências bem sucedidas de Buenos Aires. A diagramação foi parte de um todo, importante mas não o mais valioso, como o teletipo, imenso, alto, transmitindo em espanhol, com notícias vindas dos Estados Unidos, via cabo submarino e fios de telégrafos.

A partir daquele Diário do Paraná nada mais seria como dantes. Era a imposição da modernidade que ia chegando ao Rio e a São Paulo também. Uma nova forma de escrever, colher informação, fazer opinião, caminho para eliminar o panfletário e o romântico, o beletrismo em jornal. A queda do "nariz de cera" foi o mais emblemático capítulo de uma era jornalística que findava. No fundo, a entronização das técnicas jornalísticas americanas, que o Diário Carioca, do Rio, havia assumido e que gerava frutos.

Era também uma nova forma de fazer jornalismo, levando em conta a comunidade maior, a interlocução com o leitor num tempo em que a urbanização do país começava a mudar aceleradamente a sociedade, seus usos, costumes, seus anseios, suas posições políticas, seus laços antes fortemente rurais.

Os artífices da revolução estão, em boa parte, aí, disponíveis para testemunhos. São jornalistas que podem falar muito mais do que sobre o "lead" (abertura de texto) ou a pirâmide invertida da informação. Foram introdutores dos textos fortemente substantivos e sem espaços para adjetivos e eufemismos. Davam-se os primeiros passos para a chamada pesquisa jornalística e as reuniões de pauta. Embora, é verdade, o exercício crítico em defesa dos interesses da sociedade esbarrasse sempre nos compromissos com grupos dirigentes locais e governos.

Mas talvez ainda seja cedo para aquilatar todas as latitudes da dependência do jornal DP do capital local – o dos cafeicultores, que o apoiaram financeiramente – e do governo, o de Bento Munhoz da Rocha Neto.

Os jovens intelectuais que comporiam o jornal, talvez sentindo cedo as amarras e limitações jornalísticas, teriam achado sua alternativa. Assim, fizeram das expressões culturais clássicas – a música, o teatro, as artes plásticas, a literatura, o cinema – a melhor forma de inserir-se no "bonde da história" que chegava. E o fizeram deixando marcas históricas.

Sylvio Back, Walmor Marcelino, Luiz Geraldo Mazza, Oscar Milton Volpini, Adherbal Fortes de Sá Junior, Eduardo Rocha Virmond, René Ariel Dotti, Ennio Marques Ferreira (por curto espaço de tempo), Lôio Pérsio – esses foram alguns dos revolucionários do DP. Houve também os "carpinteiros", os que davam feições de jornal à produção de uma redação jovem e inquieta. Dentre eles, Ayrton Luiz Baptista, Emílio Zola Florenzano (depois teria papel capital ao lado de Alberto Dines, no Jornal do Brasil), Roberto Novaes, Carlos Danilo Costa Côrtes e os editorialistas, como Walmor Coelho (morreu há dias) e Colbert Malheiros. De propósito, omito o nome dos colegas da linha de frente, os repórteres: são muitos no panteão de minha admiração e corro o risco de cometer injustiças. As exceções são Mauro Ticcianelli, hoje em Londrina, e Paulo Marins de Souza. Ganharam, separadamente, o mais ambicionado prêmio da categoria reportagem, o Esso.

Mauro foi a campo e produziu reportagens históricas sobre os conflitos de terras no Sudoeste (nessa fase, ocorre abertura para grandes enfoques, tímida, mas importante). Marins desbravou a então escondida Guaraqueçaba, sua fauna, sua flora, sua gente, suas raízes.

Houve os que passaram pelo DP, fizeram cobertura política, projetaram-se e alçaram amplos vôos, como José Richa e Léo de Almeida Neves.

Claro que embora líder (os Associados eram uma espécie de Rede Globo de hoje), o Diário do Paraná não reinaria sozinho: na Rua Barão do Rio Branco, João Feder, João DeDeus Freitas Neto e Mussa José Assis (em anos seguidos) levaram à modernização O Estado do Paraná e a Gazeta do Povo, que, depois, com Francisco Cunha Pereira Filho, assumiria a liderança que perdura. João Milanez fez a Folha de Londrina conquistar espaço definitivo.

De lá para cá, muitos jornais surgiram, outros tantos acabaram. Os leitores, hoje bem exigentes, estão decidindo o futuro dessa mídia. Uma coisa é certa: os veículos que atenderem às expectativas de qualidade editorial herdarão a "eternidade".

Aroldo Murá G. Haygert é jornalista, presidente do Instituto Ciência e Fé e professor da Facinter.

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