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Felipe Lima

Causa estranhamento o reiterado comportamento exibido pela presidente da República nos últimos dias. Sob a pressão de uma realidade incômoda, tanto ela quanto vários de seus ministros e assessores manifestam inconformismo com o contraditório, atacando adversários políticos de forma desrespeitosa e tentando transformá-los em inimigos, como se o país estivesse em conflito civil.

Essa repetição de comportamentos inconvenientes acabou transformando o palácio presidencial em comitê partidário, onde pessoas – geralmente em situação de dependência ou carência – são chamadas para formar claque a pronunciamentos radicais que insuflam em vez de apaziguar; que injuriam em vez de refutar; que insultam em vez de expressar tolerância com pontos de vista alheios.

Tolerância constitui o princípio fundamental das relações humanas, para que sejam respeitadas as convicções e a dignidade de cada um. Esse comportamento é esperado desde o mais simples cidadão até o ocupante da cadeira de presidente da República, visto que o primado republicano também pede uma postura decorosa daqueles chamados a governar.

No palácio presidencial, pronunciamentos radicais insuflam em vez de apaziguar

Na busca febril por apoio na votação do impeachment, o governo piora as condições financeiras do país, transformando-o em balcão de negócios e deixando de implementar as urgentes e necessárias medidas de corte de despesas. Desrespeita assim, uma vez mais, os princípios da ética e da moralidade.

É por isso que, quando circunstâncias extraordinárias se impõem, regimes republicanos preveem a possibilidade de cessação do mandato e o afastamento do mandatário governante. Nessa dimensão, o único golpe que pode ocorrer é o do governante que não se resigna à decisão do povo, por si ou seus representantes legítimos, em processo de impedimento regulado pela Constituição e pelas leis, supervisionado pela Justiça.

Em carta aberta à população, o jurista Eros Grau, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF), traduziu esse sentimento ilógico acerca da afirmativa de que impeachment é golpe: “A afirmação de que a admissão de acusação contra o presidente da República por dois terços da Câmara dos Deputados consubstancia um golpe é expressiva e desabrida agressão à Constituição, própria a quem tem plena consciência de que o presidente da República delinquiu, tendo praticado crime de responsabilidade. Quem não é criminoso enfrenta com dignidade o devido processo legal, exercendo o direito de provar não ter sido agente de comportamento delituoso. Quem procedeu corretamente não teme enfrentar o julgamento pelo Senado Federal. Já o delinquente faz de tudo procurando escapar do julgamento. A simples adoção desse comportamento evidencia delinquência”.

Se, após esgotar os prazos e procedimentos e assegurada a regularidade formal do processo, o Congresso considerar por bem aprovar o impeachment, a normalidade da democracia e a superioridade da tolerância civilizada impõem que a decisão seja cumprida, em um ambiente de pacificação e concórdia, sob o império da lei e da ordem.

Neste cenário, cabe à opinião pública manter-se vigilante e jamais resignada; exercendo, ela sim, a tolerância própria de uma sociedade amadurecida e democrática, que resiste às provocações e ameaças porque é consciente da força de seu direito e da legitimidade de suas decisões soberanas.

Por fim, vale deixar claro que tolerância não significa transigência nem resignação. Como lembrou Rui Barbosa, “desde que a violência pisa aos pés, arrogantemente, o código escrito, cruzar os braços é servi-la. Os tribunais, a opinião pública, a consciência, não podem ser neutros entre a lei e o crime”. Tolerância ao contraditório, jamais ao ilícito!

Edson José Ramon, ex-presidente da Associação Comercial do Paraná (ACP), é presidente do Instituto Democracia e Liberdade (IDL).
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