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Albert Einstein, o grande gênio considerado o maior cientista do século passado, tinha uma proposta inusitada: a criação de um governo mundial para resolver certas questões globais. Para ele, a humanidade se depara com problemas que demandam solução global, que deve ser compartilhada por um conjunto de países e não por apenas um ou alguns países. Quando formulou sua teoria, Einstein tinha em mente basicamente os problemas da paz e os conflitos militares entre as nações. O clima psicológico na época era de alto pessimismo, em função da brutalidade da Segunda Guerra Mundial.

A idéia consistia em que as nações instituíssem um organismo internacional, dando-lhe um estatuto com atribuições específicas e que se comprometessem a aceitar as decisões desse organismo. Parecia uma idéia estranha; mas não era. Quando o comportamento de um povo não afetava muito a vida das pessoas em outras partes do globo, prevalecia a idéia de autodeterminação dos povos no seu sentido mais amplo. Isto é, os assuntos internos de uma nação deveriam ser resolvidos apenas e tão somente por aquela sem a intromissão de outros países e dos organismos internacionais.

A teoria da autodeterminação dos povos permitiu que ditadores sanguinários de esquerda e de direita usassem e abusassem do poder de matar, torturar, agredir e transgredir os direitos humanos, sem ser incomodados pelo resto do mundo. Essa época acabou. Não existe mais ação isolada de uma nação que fique restrita a efeitos internos. Quando uma ditadura restringe a liberdade, as pessoas buscam exílio em outros países. É o caso de Cuba, que tem o maior programa de exclusão social do planeta: 20% dos cubanos vivem nos Estados Unidos. Quando um país desmata e polui a atmosfera, o problema é do mundo todo, pois os danos são globais e a humanidade tem o direito de interferir. Quando um país persiste na pobreza e na miséria, sua população migra para nações mais adiantadas, em busca desesperada de sobrevivência e de uma vida digna. Portanto, o mundo tem algo a ver com isso.

Não é necessária muita teorização de natureza geopolítica para se compreender que o espaço de atuação autônoma e isolada está se reduzindo rapidamente. Mais recentemente o problema do aquecimento da Terra fez com que o mundo inteiro se dedicasse a discutir causas, conseqüências e ações conjuntas, para salvar o planeta e impedir que a humanidade seja extinta. Tanto é que o governo da França propôs a criação de uma agência mundial específica para o meio ambiente, vinculada à Organização das Nações Unidas, a ONU.

Vale a pena voltarmos à idéia de Einstein, de instituir um governo mundial, destinado a cuidar de quatro temas, todos começados com a letra "p", tanto em português como em inglês: paz (peace); pobreza (poverty); poluição (polution) e população (population).

Quando George Bush decidiu atacar o Iraque, mesmo sem o apoio da Assembléia da ONU, ele provocou dois estragos na ordem mundial. O primeiro foi a desmoralização da maior e mais eficaz instituição mundial, com a conseqüente perda da capacidade desse órgão de impedir outros conflitos militares sanguinários. Se os EUA podem decidir suas guerras sem dar a menor atenção para as decisões da ONU, então outros países estão liberados para fazer o mesmo, e a barbárie só tende a aumentar. O segundo estrago que Bush fez foi sinalizar ao mundo que cada país pode ser livre para fazer o que quiser – não só em termos de guerras, mas em outros campos, a exemplo do meio ambiente. Que moral tem a ONU para se meter na decisão do Irã ou da Coréia do Norte, em relação ao programa nuclear e construção de bombas atômicas? Nenhuma!

A ONU está enfraquecida. Enquanto isso, a Europa, que há pouco mais de um século deixou de esfacelar-se em guerras entre seus países, vai consolidando a União Européia, com integração comercial, liberdade de movimento de pessoas e capitais, moeda única, Banco Central único e tendendo a viver em torno de um mesmo corpo de leis. Parece que mais uma vez na história da humanidade é da Europa que sairá a solução para que o mundo se una em torno de um mesmo projeto para preservar a paz, reduzir a pobreza, diminuir a poluição e conter a explosão populacional.

A idéia de um governo mundial, como queria Einstein, num momento em que a ONU vem sendo esvaziada pelos delírios dos EUA, parece uma idéia ingênua. Pode até ser. Mas muitas idéias não-ingênuas lançaram o mundo na situação em que está. Portanto, é do sonho e das idéias inusitadas que poderão vir as atitudes que levem a humanidade a ter chance de não desaparecer. Caso contrário, só nos resta aguardar que a mesma genialidade do homem, que o fez alcançar as estrelas e penetrar na intimidade das micropartículas, acabe cumprindo o preceito bíblico que afirma que "do pó vieste e ao pó voltarás".

José Pio Martins é professor de Economia e vice-reitor do Centro Universitário Positivo (UnicenP).

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