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A "carta aberta ao próximo presidente (qualquer que seja ele)" é o ponto de partida de uma série de opiniões e conselhos do cientista social e diplomata Paulo Roberto de Almeida, autor de diversos livros sobre as relações econômicas internacionais do Brasil, sua história financeira e o processo de integração no Mercosul.

A carta é parte da obra A grande mudança (São Paulo, F-QM Editores Associados Ltda., 2003), na qual o autor faz observações de natureza econômica, política e social. O texto foi escrito em Washington, no mês de agosto de 2002, portanto, durante o período em que, no Brasil, os candidatos Lula e Serra intensificavam a propaganda eleitoral. Alguns recados, pela atualidade e permanência, devem ser referidos para a reflexão dos cidadãos em geral e dos eleitores em especial.

"Não tente inovar apenas para se diferenciar de seu predecessor". Essa primeira advertência põe à mostra um dos graves problemas do desvio de conduta de muitos chefes do Executivo dos três níveis de poder. Determinados projetos da administração pública e de interesse social não devem padecer da solução de continuidade em função das idiossincrasias partidárias ou pessoais dos administradores que se substituem. É correta a crítica: "Fazer política com sinal trocado apenas para se diferenciar do seu adversário ou antecessor costuma ser sinal de infantilidade política, não de maturidade".

"Cuidado com as más companhias". Todo gerente dos interesses públicos ou privados precisa de bons assessores para discutir e propor soluções para os mais variados problemas. O autor sugere reuniões abertas e seminários de trabalho, nos quais todos os grupos de interesse poderão apresentar as suas propostas de "prioridades nacionais". Mas recomenda com vigor: "Em geral, desconfie – se puder afaste-se – de capitalistas nacionais, investidores estrangeiros, banqueiros bonzinhos, sindicalistas ativos, universitários cheios de idéias, enfim, de membros da ‘elite pensante’, aí se incluindo os ‘acadêmicos progressistas’ que lhe trazem uma nova ‘idéia genial’ para resolver tal ou qual problema nacional ou alguma angústia nacional".

"Não confie na onipotência do governo". A crença de que o poder tudo pode é uma das mais antigas ilusões populares. A expectativa de uma imensidão de homens de boa vontade e das pessoas carentes é transferir para o Estado, suposto poder absoluto, a responsabilidade para a solução de todos os seus problemas. Esse Estado soberano como o concebeu Thomas Hobbes (1588–1679), em seu Leviatã, é um mito. "O governo é forte, mas não é Deus", observa o diploma e cientista social. "Geralmente ele tem alguma sapiência, mas muito pouca onisciência, uma vez que depende de burocratas e de assessores novatos, e está sempre cercado de aduladores da corte, de aproveitadores e de oportunistas de todo tipo, como sempre acontece com qualquer governo".

"Políticas sociais por via burocrática têm alto custo de administração". A certeira observação lembra que a grande variedade de programas ditos sociais (habitação, leite, emprego etc.) jamais resolveu os problemas para os quais foram instituídos. E isso porque "os programas de apoio que não passam pelos preços de mercado acabam tendo um alto custo de administração estatal".

"Salário mínimo obrigatório diminui a empregabilidade e prejudica os mais pobres". Esta conclusão é a que mais instiga a polêmica entre os especialistas. Mas é inegável que "a determinação oficial de um salário ‘mínimo’ resulta na produção informal de um desemprego ‘máximo’. E segue a proposta: "Para empregar todos os (ou a maioria dos) demandantes, o mercado deveria pagar o que ele mesmo estabelece como salário de equilíbrio, não o que é decretado por alguma autoridade".

O livro A grande mudança, pensado e escrito com sensibilidade e competência, é um valioso roteiro não somente para o administrador público. Ele é também um bom endereço para a leitura e meditação das novas gerações de políticos do presente e do futuro.

René Ariel Dotti, advogado e professor universitário, ex-membro do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná.

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