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O Código Florestal Brasileiro, instituído na década de 60, foi criado com o intuito de representar um instrumento para garantir uma utilização adequada do território sem acarretar a destruição completa de nossas áreas naturais. Com uma extensão de 8 milhões de quilômetros quadrados, a racionalização espacial do uso do território brasileiro é uma necessidade fundamental, garantindo grande relevância para esta Lei.

Aqui no sul do Brasil 20% da extensão das propriedades rurais devem manter sua condição natural – a reserva legal –, permitindo-se, no entanto, o manejo racional destas áreas. São, portanto, áreas naturais com potencial de uso econômico, desde que corretamente manejadas. Além disto, áreas de encostas, topos de morro e matas ciliares são consideradas Áreas de Preservação Permanente, estas diferindo da Reserva Legal em função de sua intocabilidade.

Muito distante de ser uma imposição injusta aos proprietários, que "deixam de poder utilizar áreas para atividades econômicas", estes trechos protegidos têm uma finalidade extremamente importante para todos nós, proprietários de terras ou não – cabe ressaltar que a maioria de nós não é. Mesmo fora do dicionário daqueles que consideram áreas naturais partes inúteis de suas propriedades, os "serviços ambientais" têm sua importância largamente aceita e difundida. Serviços ambientais são todos os bens gerados a partir da conservação de áreas naturais: água, polinização, biodiversidade, equilíbrio do clima, segurança, paisagem, lazer, turismo, matérias-primas de toda a ordem são bens obtidos a partir das áreas naturais. E deixam de estar disponíveis se ocorrer a sua destruição.

Em outras palavras, a avidez e a falta de espírito público daqueles que estão interessados em demolir o Código Florestal causará dois efeitos práticos evidentes: permitirá a continuidade do uso intensivo, de uma minoria, de áreas que deveriam cumprir o papel de produzir todos os benefícios dos serviços ambientais, já limitados ao extremo em algumas regiões onde o descumprimento do código é generalizado; e causará a diminuição paulatina na oferta destes serviços para toda população, inclusive dos próprios proprietários supostamente favorecidos, afetando a qualidade de vida de todos nós.

Ainda, os mercados de serviços ambientais, cada vez mais fortalecidos, indicam franca tendência à remuneração pela existência de áreas bem conservadas, justamente na contramão daqueles que insistem em apostar no passado. Será que daqui a alguns poucos anos desmatar significará prejuízo?

Na prática, no entanto, ao longo das últimas décadas, o Código Florestal vem sendo acintosamente desrespeitado, com amplo avanço ilegal sobre as áreas de Reserva Legal e Áreas de Preservação Permanente. O setor agropecuário extensivo é o maior responsável por um estado de desobediência assumida, historicamente utilizando de pressões políticas que impeçam a aplicação da Lei.

No ano passado, um movimento do Ministério do Meio Ambiente, condicionando o respeito ao Código Florestal a todos os proprietários interessados, dentre outros, a acessar empréstimos subsidiados, desperta o clamor dos que não admitem a sua aplicação e lutam com todas as forças para não haver uma imposição definitiva para que as áreas hoje degradadas sejam restauradas.

São evidentes os interesses dos que se movem a favor das alterações do Código Florestal. Interesses de um setor de enorme importância para a economia, alicerçado politicamente de maneira muito poderosa, que comunica com competência mesmo sem necessariamente sustentar tecnicamente suas posições, e sem compromissos com o restante da sociedade. Como que impedidos pela cegueira das fórmulas simplistas, não compreendem nem assimilam a vital importância da existência de frações conservadas em todas as regiões do país. Um enorme mosaico de usos distintos, onde tudo pode ser produzido, desde que dentro de limitações que respeitem os direitos e os interesses do restante da sociedade.

Clóvis Ricardo Schrappe Borges é conservacionista, médico veterinário e MSc em Zoologia.

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