O Cadastro Positivo cria uma casta de excluídos: os que são bons pagadores, mas que não utilizam o sistema financeiro de créditos. Esses não terão privilégios
Quem nunca se irritou com as dezenas de ligações de telemarketing de bancos e instituições financeiras oferecendo serviços o tempo todo, por telefone? Com a aprovação do chamado Cadastro Positivo, o incômodo tende a aumentar.
É sabido que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) já prevê o cadastro de inadimplência, costumeiramente chamado de cadastro de maus pagadores. São os temidos Serviços de Proteção ao Crédito SPCs ou Seprocs os Cadins Cadastro de Inadimplentes, entre outros. As associações comerciais, em geral, administram esses bancos de dados e controlam a situação de inadimplência nas relações comerciais.
A pretensão agora é criar o chamado Cadastro Positivo de Dados, que terá a incumbência de guardar dados de consumidores considerados bons pagadores. Ou seja, aqueles que necessitam ou preferem utilizar créditos e pagam as dívidas em dia. A promessa é a de que esses consumidores terão privilégios na hora de conseguir novos empréstimos, seja pela facilitação de exigências pessoais, seja pelas taxas diferenciadas de juros.
No entanto, o projeto de lei, que já foi aprovado pelo Senado Federal e que aguarda a sanção do presidente de República, ofende o princípio constitucional da igualdade, já que desconsidera o consumidor que paga suas contas à vista. Dessa forma, o Cadastro Positivo cria uma casta de excluídos: os que são bons pagadores, mas que não utilizam o sistema financeiro de créditos. Esses não terão privilégios!
Outra justificativa dos adeptos ao Cadastro Positivo seria a de que esse sistema ajudaria a baixar os juros dos empréstimos bancários. No entanto, estudos jurídicos e econômicos não confirmam isso. Exemplo é o SRC (Serviço de Registro de Créditos) do Banco Central, que tem função semelhante à que se pretende o Cadastro Positivo: armazenar informações dos "bons pagadores". Ou seja, a criação de mais um banco de dados, agora inserido no Código de Defesa do Consumidor, certamente não proporcionará a baixa dos juros.
Na verdade, o Cadastro Positivo irá favorecer não os consumidores, e sim os bancos, uma vez que, historicamente, a concessão de crédito está ligada aos lucros bancários, os chamados spreads. Para se ter uma ideia, o spread bancário brasileiro é um dos mais altos do mundo, supera o do Chile em 12 vezes. Segundo especialistas econômicos, os brasileiros pagam juntos cerca de R$ 261 bilhões de juros bancários ao ano.
Diferentemente do cadastro negativo, o Positivo não exige um comunicado prévio, informando que o consumidor terá os dados registrados. O argumento é que, se o cadastro é positivo, o comunicado seria dispensável. Porém os consumidores não terão a opção de não fornecer informações ao cadastro, o que poderá trazer diversos prejuízos. Por exemplo, no caso de empresas consumidoras, que poderão ter seus dados revelados à concorrência.
O acesso a esses dados fere o princípio constitucional da privacidade. Afinal, os fornecedores poderão exercer com mais intensidade a oferta de créditos, porque detêm um precioso rol de bons pagadores, potenciais clientes para novas operações bancárias. Outro aspecto sensível ao controle desses dados é a prática da comercialização, de forma lucrativa, dos dados cadastrais dos consumidores aos comerciantes, que utilizam as informações para fazer propaganda de seus produtos e serviços. Ainda que o crédito seja necessário para o incremento do comércio, o superendividamento tende a aumentar!
E como prêmio, os "bons pagadores" do sistema financeiro de crédito receberão mais uma centena de ligações de telemarketings querendo vender seus serviços! E não vai adiantar mudar o número do celular, pois os seus dados serão descobertos!
Ciro Expedito Scheraiber, procurador de Justiça, é coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor do Paraná.
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