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O mundo está cada vez mais governado pela impessoalidade. Ou seja, governado por leis que se formam por dinâmica e objetividade tais, oriundas do mundo empírico, que a nós é reservada apenas a missão de descobri-las. Assim se dá principalmente na área da economia. Essa ciência, a despeito de ter a contribuição de componentes psicológicos em certos momentos, vai construindo leis de aplicação universal. Por exemplo, bancos centrais independentes atuam como guardiães da moeda e protegem o interesse geral da sociedade; já o câmbio flutuante viabiliza o regime de metas de inflação, ensejando o controle das emissões monetárias; e estas, quando descontroladas, são importante foco de elevação de preços; aumentos salariais descasados do aumento da produtividade da economia causam disputa pela mesma quantidade de bens, e, por consequência, a elevação do seu preço.

Governos que tenham o mínimo de juízo se submetem a essa realidade pacificamente. Já quando o que importa é o poder pelo poder, essas leis são trituradas pelo apetite eleitoral. E, mais dia, menos dia, todos nós ajudaremos a carregar o pesado fardo das correções.

O parlamentarismo é um regime de governo comprometido com ideias

É bom dizer que o regime presidencialista, cuja lógica tende a assumir práticas que passam pela cooptação e aliciamento, com reflexos na contabilidade dos orçamentos públicos, vislumbra o nosso bolso como aliado qualificado e compulsório. Quem tem alguma dúvida sobre isso pode conferir as estatísticas. Até o início da vigência da Constituição de 1988, a carga tributária estava em 24% do PIB. Hoje, estamos perto de 36%, e mais um déficit operacional em torno de 3%. O déficit nominal, que inclui as despesas com os juros da dívida, já passou de 8% do PIB. Como inverter a voracidade dessa dinâmica?

O parlamentarismo é um regime de governo comprometido com ideias, resultando em coalizão de partidos com afinidade ideológica, pelo menos enquanto isso seja possível. Por ele se substitui a presença de governantes iluminados, missionários e, às vezes, até com desvairadas inclinações demagógicas por um primeiro-ministro oriundo do Parlamento, que tem a responsabilidade de governar e de fazer o governo dar certo, porque sobre ele paira a espada de Dâmocles (o perigo iminente), representada pela moção de censura, que resultaria em queda do gabinete ministerial e novas eleições para a composição do Parlamento. Os esforços tendem a ser comuns e quebra-se a lógica do poder pessoal, própria do presidencialismo.

Esse regime tem uma característica muito saudável: quem faz as leis é quem tem a responsabilidade de governar. Porém, se o primeiro-ministro e seu gabinete apresentarem resultados inadequados, os partidos da coalizão dificilmente assumirão o ônus do insucesso e fatalmente se inclinarão por votar a moção de desconfiança.

A sua implantação passa, necessariamente, pela evolução da nossa cultura política, que não dispensa novos ingredientes e encaminhamentos: fidelidade partidária, voto distrital (nesse quesito expresso mais intensamente a minha opinião pessoal), voto facultativo, cláusula de barreira, reordenação do horário eleitoral, limites de gastos eleitorais, com permissão de contribuições apenas por parte de pessoas físicas. O que não dispensa os ingredientes que mencionei no fim do parágrafo inicial deste texto.

É indiscutível que todas as formas de governo carregam as suas imperfeições, mas seria um grande avanço trabalharmos para que o poder político se expresse por ideias e não pelo voluntarismo pessoal, que tanto pode nos salvar como nos conduzir à ruína. Mitos são criados e alimentados porque servem ao interesse de grupos e de pessoas, buscando cristalizar-se no poder; desfazê-los é uma necessidade do trabalho consciente, conjugado ao interesse público, ao bem comum, ao livre debate das ideias, aos direitos humanos e à pluralidade democrática.

Tenhamos claro: a forma mais eficiente e profunda de trabalharmos pela paz social e pela busca da igualdade é com a presença de homens públicos competentes, moralmente probos e comprometidos com uma ordem social justa e generosa, e que vislumbrem a política como elevada missão.

Já é tempo de reconhecermos as nossas carências!

Irineu Berestinas foi vereador, ex-secretário de Indústria, Comércio e Turismo e diretor-presidente da Companhia de Desenvolvimento de Arapongas.
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