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Recentemente li na Gazeta do Povo o artigo intitulado "O desafio de avaliar (bem) os professores" e gostaria de apresentar algumas reflexões, tendo como referência minha formação acadêmica e experiência como coordenadora pedagógica no ensino superior.

Com certeza, todos os processos humanos precisam ser avaliados! Avaliamos sempre, em todas as situações do dia a dia – quando, por exemplo, analisamos o fluxo de carros em determinada rua e escolhemos outro trajeto para não nos atrasarmos. Mas nem todos os processos avaliativos são tão simples, e avaliação do desempenho docente se insere neste grupo.

Vários são os fatores que interferem no desempenho do professor em sala de aula e, dependendo do modo como a avaliação desse processo se realiza, ela tende a empurrar unicamente para o professor a responsabilidade do processo ensino-aprendizagem.

Na verdade, a sala de aula é síntese de múltiplas determinações, não está isenta dos problemas e contradições que ocorrem na instituição de ensino superior (IES) como um todo, e nem das determinações mais amplas da sociedade. Exemplifico: nossa sociedade difundiu o raciocínio do cliente no ensino, dando a entender que o professor presta um serviço ao aluno, seu cliente. Se essa visão estiver presente na IES, será privilegiada a ação docente que sempre se adapte aos desejos do aluno. Mas será que o aluno realmente sabe o que é necessário para ser um bom profissional? Será que em alguns momentos ele não precisará aprender coisas que, aparentemente, são desinteressantes, mas essenciais para o exercício profissional? Nesse caso, será que um professor que se mantenha firme nesse direcionamento será bem avaliado por seus alunos? No entanto, se a IES difunde outra visão em relação ao papel do professor como profissional, que não o de atender às necessidades imediatas do aluno, mas de gerar novas necessidades a partir da área de atuação futura e das demandas da cidadania, teremos outra avaliação do mesmo docente.

Outro aspecto relevante é a concepção de ensino superior e o quanto ela está clara para quem avalia o professor. Qual o objetivo do ensino superior: profissionalização ou cidadania? O que é aula? Como deve ser a organização do espaço e do tempo em cada disciplina? Avaliar sem antes refletir coletivamente sobre esses pontos fatalmente levará à análise do desempenho docente a partir do senso comum, que espera um professor transmissor de conhecimentos prontos e inquestionáveis, mas amável e cordato com os alunos.

Também não podemos esquecer de que há especificidades por curso ou mesmo por disciplinas, sendo algumas de mais aprofundamento teórico, outras mais teórico-práticas. Neste caso, como avaliar os professores pelos mesmos critérios?

Vale ressaltar ainda a interferência das condições concretas de trabalho na atuação do professor: número de alunos por turma, qualidade do espaço físico, disponibilidade de equipamentos (laboratórios, softwares, recursos audiovisuais), presença ou não de discussões coletivas sobre o projeto de curso alinhando as ações.

Finalmente, é preciso pensar o que é avaliar, entendendo que se trata de um processo de análise com vistas à sua constante melhoria. A compreensão do objetivo da avaliação não está dada, porque na história da educação geralmente ela serviu para classificar e excluir, e não para qualificar os processos e as pessoas. Trata-se de uma mudança de paradigma, que poderá ser mais facilmente alcançada se a IES investir maciçamente na formação continuada dos docentes.

Não pretendi afirmar que ao professor não cabe a responsabilidade pela qualidade do seu trabalho, mas sim demonstrar que não se trata de uma tarefa individual e que, por isso mesmo, ela é complexa. Razão pela qual precisamos planejar cuidadosamente a avaliação do desempenho docente, vendo-a como parte de um todo maior.

Inge Suhr, doutora em Educação, é professora e coordenadora pedagógica do Centro Universitário Internacional Uninter.

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