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Na viagem à Venezuela para participar da campanha eleitoral do companheiro Hugo Chávez, candidato à reeleição, o presidente Lula aproveitou o improviso na inauguração da ponte sobre o Rio Orinoco, na fronteira entre os dois países, para acertar as contas dos seus ressentimentos com a imprensa.

Bateu firme. Na parte que nos toca, deu o dito pelo não dito das reiteradas promessas de um novo relacionamento com a mídia.

Dirigindo-se diretamente ao fraterno amigo Chávez, despejou as mágoas que dissimulava por óbvias conveniências. Foi às do cabo: "Fui a Caracas, vi a televisão, e voltei ao Brasil dizendo a mim mesmo que jamais tinha visto um tipo de comportamento de um meio de comunicação, agredindo um presidente da República como tu fostes agredido". E, no recado direto: "Eu jamais imaginei que isso pudesse acontecer no Brasil, e aconteceu o mesmo, querido companheiro".

Não é o caso de enterrar a carapuça, pois o presidente foi explícito e direto. Nem se justificaria invocar o conselho ético que recomenda a lavagem de roupa suja no tanque doméstico. Ou a perplexidade ante a súbita cambalhota da euforia dos 58 milhões de votos, carimbado pela promessa de uma entrevista coletiva, antes da passagem da faixa de uma das mãos para a outra.

Confessemos que a paulada no exterior e em má companhia, doeu no couro da mídia. E, como decano dos repórteres políticos, arrisco o palpite de uma proposta de acordo entre eternos desavindos. Afinal, tudo não vai além de uma questão de ponto de vista, de boa vontade para aceitar as explicações oficiais.

Para começar, colhendo exemplos colhidos na horta do governo, vem mesmo a calhar a decisão moralizadora do presidente da Câmara e ex-presidente da República por um dia, deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP) determinando o cancelamento da compra se 660 pastas, tipo 007, ao custo de R$ 407 mil, que seriam distribuídas aos 513 deputados eleitos e reeleitos.

Na toada disciplinadora, o presidente Aldo Rebelo cuida de aliviar as aperturas dos deputados com o reajuste dos subsídios, que saltarão de R$ 12,8 mil para a equiparação com os vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) que pairam nas alturas de R$ 24,5 mil. O efeito cascata inundará o Senado, assembléias legislativas e câmaras municipais. No repeteco na ferradura, anuncia-se o fim das verbas indenizatórias de R$ 15 mil mensais. O Legislativo incorpora a vantagem indecorosa ao subsídio e mantém o cacho de mordomias de um dos melhores empregos do mundo.

Em rápido giro pelo Palácio do Planalto, é de cortar o coração a carta de despedida de Luiz Gushiken da chefia do Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (NAE), onde se amoitava desde as denúncias de envolvimento com a operação do mensalão. Amigo íntimo do presidente, Gushiken imola-se para não contaminar o segundo mandato do chefe que idolatra.

A situação piora com o pedido de demissão do chefe de Gabinete da Presidência, Gilberto de Carvalho – um dos últimos do núcleo duro, que nos dourados tempos acolhia o todo-poderoso chefe da Casa Civil, José Dirceu, e o então badalado ministro da Fazenda, Antônio Palocci. Do quinteto, resta apenas o secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci.

Engolir sapos é o preço para a reconciliação da mídia com o reeleito. Talvez valha a pena pagá-lo. Afinal, o segundo mandato começa em 1.° de janeiro e o novo exibe as rugas dos aborrecimentos e verga ao peso da carga da herança maldita dos quatro anos inaugurais do governo "como nunca se viu na história deste país".

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