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| Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo

A universidade é uma instituição de mais de oito séculos. A UFPR, a mais antiga do Brasil, completou há pouco 106 anos. No estrangeiro ou aqui, durante todo este tempo a universidade cumpriu e cumpre um papel único e insubstituível: o de lugar do saber e da inteligência. Mesmo em períodos em que foi questionada (como na época napoleônica na França), ela se manteve protagonista. A Sorbonne Université – com a qual, aliás, a UFPR tem laços institucionais – continua sendo símbolo de prestígio acadêmico.

No caso brasileiro, existem algumas peculiaridades. Aqui não se criaram grandes instituições de pesquisa (como os Max Planck, na Alemanha, ou como as Écoles ou Collège, na França). A pesquisa e a produção do conhecimento surgiram tardiamente e concentraram-se nas universidades, sobretudo nas universidades públicas. Embora hoje representem menos de 15% do número das instituições de ensino superior, elas são responsáveis por mais de 90% da produção da ciência, tecnologia e inovação no Brasil.

A sociedade brasileira talvez nunca tenha precisado tanto quanto agora das ciências ditas “humanas”

O que isso significa? Que a universidade pública é essencial para o Brasil. Não só na formação dos melhores quadros (profissionais, intelectuais ou professores nos outros níveis de ensino), mas também como protagonista nos avanços que são pressupostos para o desenvolvimento e para a soberania do país. Não haveria e não há melhoria nas nossas indústrias (vide indústria aeronáutica ou pré-sal) ou na produtividade no nosso agronegócio sem a ciência e a tecnologia que se produz, majoritariamente, nas universidades públicas. Para citar apenas um exemplo, uma pesquisa da UFPR selecionou bactérias (azospirillum) promotoras de crescimento vegetal que têm o potencial de aumentar a produtividade agrícola e economizar centenas de milhões de dólares por ano em fertilizantes nitrogenados.

Sem valorizar esse lugar único de formação e de produção de saber, a economia brasileira, a soberania nacional, a preservação de nossa identidade civilizacional e o nosso futuro estarão comprometidos. É por isso, e não por razões paroquiais, que a universidade pública, neste momento histórico, deve ser valorizada, celebrada, incentivada. Detratá-la é fazer aposta contra o desenvolvimento, contra nosso legado e contra as luzes que sempre enfrentaram as várias formas de obscurantismo. Em nosso estado, pode-se dizer que sem a UFPR – a alma mater dos paranaenses – a nossa trajetória social, econômica e cultural teria sido mais pobre.

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O futuro das universidades se mostra desafiador: é tarefa urgente se conectar melhor com a sociedade, aprofundar as formas de inovação (em que a UFPR já é a segunda universidade brasileira segundo rankings prestigiados) e compreender melhor tanto os desafios da quarta revolução industrial quanto os novos meios de circulação e filtragem dos saberes. Também fazer a lição de casa, buscar maior eficiência e combater os corporativismos, mas mantendo aqueles que são seus eixos vitais: a liberdade interna, a inclusão e a criatividade, sem as quais a qualidade acadêmica não viceja.

E creio que a sociedade brasileira talvez nunca tenha precisado tanto quanto agora das ciências ditas “humanas”, essenciais para relembrar o valor da razão, das artes, da tolerância, da memória, da civilização e dos direitos que fizeram de nós, até aqui, o que somos. É importante se concentrar nas missões reais e não em cavalos de batalha ilusórios e irrelevantes. E, se há uma militância que sempre ocupou e deve ocupar a universidade, é a do combate contra a insensatez e o obscurantismo, de maneira inclusiva, ampla e democrática; e a de espraiar formação, inteligência e desenvolvimento para o país.

Ricardo Marcelo Fonseca é reitor da Universidade Federal do Paraná.
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