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eleições 2022 - voto impresso
A participação feminina no cenário político brasileiro em 2021 ainda é muito pequena. Elas ocupam 77 cadeiras na Câmara dos Deputados e 12 no Senado Federal.| Foto: André Rodrigues/Arquivo/Gazeta do Povo

Em 3 de novembro recordamos a conquista do direito ao voto feminino, busca que se concretizou a partir de um processo histórico de consolidação das reivindicações frente aos direitos das mulheres ao longo da história. Temos motivos para comemorar? A resposta é sim. Contudo, a participação feminina no cenário político brasileiro em 2021 ainda é muito pequena. Elas ocupam 77 cadeiras na Câmara dos Deputados (de um total de 513) e 12 no Senado Federal (de um total de 81). Os números são baixos, mostram que ainda falta mais representatividade para o sexo feminino, mas não podemos desistir de buscar mais vagas na política.

Em pleno século 21 é latente a necessidade de a luta, substantivo feminino não ao acaso, ser uma constante na trajetória feminina rumo à consolidação de direitos e, especialmente, da efetiva e real igualdade de gênero.

Segundo o próprio desenrolar brasileiro, o voto feminino fora resultado de um longo processo de lutas e ações sociais: os debates sobre o direito ao voto já se iniciaram, no parlamento brasileiro, antes da primeira Constituição, datada de 1824. Assim sendo, em 5 de abril de 1928, invocando a lei eleitoral do Rio Grande do Norte, tem-se a primeira mulher a votar no Brasil: Celina Guimarães Viana.

Não obstante, fora somente a partir da promulgação do Código Eleitoral de 1932 (há 89 anos) que as mulheres alcançaram, nacionalmente, o direito ao voto. Tal conquista teve a participação e luta do principal movimento feminista de reivindicação de tal direito: as feministas da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, que veio a pressionar o então presidente Getúlio Vargas para o estabelecimento do direito do voto das mulheres. O maior nome, no entrecho nacional, fora o de Bertha Lutz: sua luta incansável pelos direitos políticos das mulheres brasileiras reverberou na aprovação da legislação que lhes concedeu tais direitos, na organização do primeiro congresso feminista do país e na assunção do mandato de deputada na Câmara dos Deputados, em junho de 1936.

As reivindicações por uma igualdade de gênero frente aos direitos políticos não se iniciaram no Brasil: a partir da Revolução Francesa, no século 18, o mundo observou uma forte pressão, ao menos teórica, por uma sociedade mais justa e igualitária – o que, inegavelmente, passava também pela busca da igualdade de gênero. Mas, diferentemente do que se pensa, o principal documento da época, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, cunhou direitos de uma forma sexista, excluindo do seu âmbito a efetivação dos direitos políticos das mulheres. Fora necessária a emergência das ideias de uma revolucionária, Olympe de Gouges, em 1791, com a publicação da Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã para, então, o mundo ocidental observar, pela primeira vez na história, a eclosão da institucionalização das demandas pelo voto feminino.

Tal documento viera a influenciar o estabelecimento, após um século, do direito ao voto das mulheres na Nova Zelândia, em 1893. Foi o primeiro país a consolidar tal direito, seguido pela Austrália, em 1902 (ainda que excluídas as mulheres aborígenes); pela Suécia, em 1906; e pela Noruega, em 1907. Nas Américas, o primeiro país a garantir o direito ao voto feminino fora o Canadá, em 1916, seguido pelos Estados Unidos, que concretizou o direito das mulheres ao voto por intermédio da 19.ª Emenda.

Na outra via, as nações que mais recentemente garantiram tal direitos às mulheres foram a Arábia Saudita, em 2015, quando então elas puderam participar, pela primeira vez, das eleições municipais; os Emirados Árabes Unidos, em 2006; e o Kuwait, que previu o direito das mulheres a votar e concorrer aos cargos eleitorais em 2005. Perceba que a luta tem de continuar!

Em termos de consolidação não apenas do voto feminino, mas da participação política da mulher no cenário público, o Brasil previu, na Lei 9.504/1997 (Lei das Eleições), a necessidade de se ter nas candidaturas que concorrerão no pleito o porcentual mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo.Todavia, observa-se que falta, ainda, uma efetiva fiscalização do cumprimento de tais porcentuais frente aos partidos políticos, especialmente pela reprodução constante de estereótipos de gênero, distanciando ainda mais a mulher do cenário político. Pior ainda é a situação quando se intersecciona com a questão da raça: segundo dados do IBGE, as mulheres negras representam apenas 2% do Congresso Nacional. Neste mesmo sentido, cabe destacar os dados levantados pela Organização das Nações Unidas em 2021: em 1.º de janeiro deste ano, as mulheres ocupavam 25,5% das cadeiras parlamentares do mundo, 5,9% das cadeiras como chefes de Estado e 6,7% como chefes de governo – sendo que, em termos regionais, a Europa seria a região com um maior número de liderança feminina.

Ainda que tenham conquistado, especialmente no último século, o básico de direitos políticos – votar e ser votada –, as mulheres ainda não conseguiram consolidar-se em muitas dessas conjunturas, já que a sociedade, historicamente machista e patriarcal, vê com desconfiança este despertar feminino rumo aos espaços que já deveriam equanimemente ter sido ocupados por mulheres e homens. Em pleno século 21 é latente a necessidade de a luta, substantivo feminino não ao acaso, ser uma constante na trajetória feminina rumo à consolidação de direitos e, especialmente, da efetiva e real igualdade de gênero.

Priscila Caneparo é doutora em Direito Internacional, coordenadora da Clínica de Direito Internacional do Unicuritiba, professora dos cursos de Direito e Relações Internacionais do Unicuritiba e membro da Academia Brasileira de Direito Internacional.

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