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Imagino que um bom número de norte-americanos deve estar se sentindo inseguro agora que a General Motors pediu concordata. Imagino e entendo.

Meu pai era vendedor de máquinas pesadas numa representação de firmas alemãs em São Paulo, quando o Brasil ainda engatinhava na produção de bens de capital.

Às vezes, explorava o trabalho infanto-juvenil (o meu), pedindo-me para levar papéis às fábricas que compravam as "suas" máquinas, no cinturão industrial de São Paulo. Ficava sempre com a impressão de que eram marcas que durariam para sempre, tal a pujança que exalavam aos olhos de um garoto.

Sumiram todas.

Meio século depois, desembarco em Doha para cobrir a conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio que lançaria a rodada de negociações que levaria o nome da capital do Qatar. Na primeira curva do caminho entre o aeroporto e o hotel, um outdoor, obviamente em árabe, mostrava aquele "S" da Sadia, que me dava uma mínima sensação de conforto no meio daquele deserto absolutamente desconhecido.

Mais cedo do que tarde, o "S" familiar vai sumir agora que Sadia e Perdigão não serão mais Sadia e Perdigão, mas Brasil Foods, com o "esse’" de Brasil mas o foods do inglês, o indefectível inglês, que acabou tornando-se familiar à força para mim, mas continua não sendo a minha língua.

GM é uma marca que talvez não suma, mas todos sabemos que, sem o colossal botox do Tesouro norte-americano, teria, sim, desaparecido, como as indústrias da minha adolescência, o "S" da Sadia em Doha e uma vasta lista de etcs.

Depois ainda tem gente que não entende o difuso desconforto que há, no mundo todo, com a tal de globalização, mesmo quando ela nada ou pouco tem a ver com Sadia, Perdigão, GM e outros cadáveres, zumbis ou comatosos.

Clóvis Rossi é jornalista.

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