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Rio de Janeiro – A profissão de jornalista cria situações estranhíssimas, que me surpreendem ainda. Trago nos ombros alguma vivência no ofício, e já não era para me entregar às vãs perplexidades do mister que escolhi, ou melhor, que a vida me obrigou a escolher.

Este intróito é para reclamar de mim mesmo. O exercício do jornalismo tem me obrigado a dar pulos no tempo e no espaço. Anos atrás, amanheci com os gerânios vermelhos arrebentando nos peitoris da Piazza Navona.

No dia seguinte, amanheci na praça Tiradentes catando dois travestis que haviam brigado por causa de um concurso de fantasia. Pouco mais tarde, saí da comitiva que acompanhou Sua Santidade aos pagos brasílicos e fiquei trancafiado um dia e uma noite na cela sombria da Delegacia dos Entorpecentes, a fim de entrevistar um tal de Tonelada, que traficava drogas. O Papa fazia outro tipo de tráfico, o sobrenatural. As diferenças entre os dois eram muitas. Mas o jornalista era o mesmo.

Na viagem que trouxe João Paulo II ao Brasil, quando o DC-10 da Alitalia penetrou no espaço brasileiro, pensei em minha mãe e senti pena de que ela não saboreasse o orgulho de ter um filho ali no céu – no céu mesmo, ao lado de um Papa. Por analogia, senti o mesmo quando a porta do xadrez se fechou e me vi cercado de criminosos de vários tamanhos e feitios. Visualmente, eu não era diferente deles. Espiritualmente, talvez fosse até o pior deles. E voltei a pensar em minha mãe: se ela me visse aqui!

Isso tudo não teria importância se não houvesse um fato relevante para minha biografia. Casada com um jornalista, ela me aconselhava a ser tudo na vida, padre, baleiro de cinema, doutor, ascensorista, bandeirinha de futebol: "Qualquer coisa serve, meu filho, desde que não seja jornalista".

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