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O Batismo de Jesus é acompanhado de três fatos, em parte estranhos: "Os céus se abriram, o Espírito desceu em forma de pomba, ouviu-se uma voz do céu". É difícil considerá-los como simples informações. Tentemos, por exemplo, imaginar a abertura dos céus, pois mais escancarados do que estão é muito difícil. A abertura dos céus se refere a uma profecia, que se encontra em Isaías 63, 15-19, em que o profeta pede a Deus para que abra os céus, isto é, para que ponha fim ao seu silêncio e pare de ficar distante do seu povo, que pecou. Suplica-lhe para que abra novamente o seu coração e volte a ser amigo dos homens. Servindo-se dessa imagem, o evangelista Marcos nos diz que, com o início da vida pública de Jesus, a reconciliação entre o céu e a terra, entre Deus e os homens, começou a se tornar realidade.

A imagem da pomba evoca o que aconteceu no tempo do dilúvio. Também então o céu estava fechado e havia inimizade entre Deus e os homens. A pomba com o ramo de oliveira foi o sinal que a paz estava restabelecida. Por que o Espírito é comparado a uma pomba? No Antigo Testamento a força do Senhor era comunicada aos reis, aos profetas e aos grandes libertadores. Este Espírito infundia-lhes coragem e tornava-os capazes para cumprir a obra de salvação que lhes fora confiada. No dia do seu Batismo Jesus recebeu essa consagração e essa força para cumprir sua árdua missão de libertador. Havia muito tempo que em Israel não apareciam homens de Deus. O último profeta morrera há cerca de trezentos anos. Parecia, em verdade, que os céus estivessem fechados e que Deus não quisesse mais falar com seu povo.

O Espírito do Senhor já não descia sobre ninguém; era como uma pomba que voava sem encontrar uma pessoa digna sobre quem repousar. Enviando seu Espírito sobre Jesus, Deus mostra ter recomeçado a falar com os homens. Em Israel, a pomba tinha também outro sentido: era o símbolo da doçura e do amor. O estilo com o qual Jesus se aproxima do homem pecador e afastado de Deus não é o do abutre ou da água, mas o estilo suave da pomba. Qual é o estilo adotado pelos cristãos das nossas comunidades em relação aos que estão longe de Deus: aquele violento das aves de rapina ou o da pomba? Testemunhamos a ternura do pai ou revelamos o rosto carrancudo e irado do deus severo? A voz do céu não deve ser idealizada como um grito.

Esta é uma expressão que os rabinos daquele tempo usavam frequentemente para apresentar solenemente aquilo que Deus pensava de determinada pessoa ou determinado acontecimento. Aqui quer dizer, que não obstante toda a aparência Deus aponta Jesus como o Servo fiel e predileto. No Antigo Testamento narra-se que o povo de Israel, guiado por Josué, teve de atravessar o Rio Jordão, antes de entrar na terra da liberdade. Jesus é apresentado pelo evangelista Marcos como o novo Josué, que guia o novo povo de Deus. Depois de atravessar o Jordão, Josué foi inundado pelo Espírito de Deus para poder cumprir a difícil missão de conduzir para a terra prometida o povo que o acompanhava. A mesma coisa acontece com Jesus: saindo da água, recebe o Espírito, a força de Deus, para conduzir os homens rumo à liberdade. Estamos conscientes de pertencer a esse povo que se encontra a caminho? Para onde nos está conduzindo o Mestre? Para onde está se dirigindo? O que devemos fazer para segui-lo?

Dom Moacyr José Vitti CSS é arcebispo metropolitano.

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