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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Catão encerrava os discursos no Senado romano com Delenda est Carthago. Era tão repetitivo que conseguiu o intento, mas também passou para a história como sujeito maçante, daqueles que ninguém convida para a festa porque sabe qual será a conversa e já está todo mundo farto dela.

Mesmo tendo esse exemplo, prefiro correr o risco a deixar passar a oportunidade que a algaravia da situação política e econômica oferece. Justamente quando a casa está desabando é preciso olhar melhor para os alicerces porque os adornos se tornam irrelevantes.

Políticos medíocres até onde o horizonte finda. Onde estão sucessores à altura dos homens e mulheres que conduziram a transição da ditadura para a democracia? Pessoas entre 40 e 60 anos que deveriam estar conduzindo o Brasil a patamar superior àquele engendrado entre 84 e 94, anos da campanha das Diretas e do Plano Real. Por que voltamos à situação confusa daquele período?

A Constituição extensa, juridicamente chamada de analítica, é a causa das dificuldades atuais

A resposta mais usual, fácil, é culpar os corruptos e sonhar que haverá alguém magicamente honesto, que escanteará os “políticos” e fará e acontecerá. Nosso currículo está cheio desses salvadores da pátria. Jânio e Collor, figurinhas fáceis nesse álbum, foram atalho para o desastre. Outro da mesma estirpe vai produzir idêntico dano.

Para achar solução é imprescindível identificar o problema. Nesse ponto, volto a afirmar que a Constituição extensa, juridicamente chamada de analítica, é a causa das dificuldades atuais. O motivo é simples: o texto constitucional trata de todos os assuntos da vida pública e privada. Assim, a norma constitucional que resolve adequadamente alguma tensão social específica hoje se torna o empeço amanhã, quando as coisas já estão muito diferentes.

Ocorre que para mudar o texto da Constituição são necessários 60% dos parlamentares, em duas votações, em cada uma das casas do Congresso Nacional. Nenhum partido, felizmente, elege sozinho mais de 25% do total de parlamentares. Assim, para fazer emendas à Constituição, quem está no governo sente carência de “base aliada” e vai à cata de apoios.

Quando os ventos eram favoráveis, o PSDB elegeu cerca de um quinto dos deputados federais. Idem para o PT. Como conquistaram mais três quintos a ponto de reduzir a oposição a cerca de 20%? Os favores em espécie ou in natura foram a tônica. As contínuas emendas à Constituição são condição de governabilidade.

Nas democracias normais governa-se com 51% a 55% do parlamento e há forte oposição. No Brasil, ser da situação é bom negócio, rende benefícios quantificáveis em dinheiro e, por força disso, as eleições se tornaram mais caras que nos Estados Unidos. Se Tancredo, Juscelino, Ulysses, Lacerda, Bento fossem vivos, não disputariam eleição contra alguém que dispõe de dinheiro ilícito ilimitado. A constância dessa situação vai apodrecendo o processo político e, mantida a causa, o problema vai piorar.

Ao contrário do que dizem nas academias jurídicas, não foi a Constituição que nos trouxe 30 anos de democracia e de avanços institucionais importantes. Tivemos tudo isso apesar dela. O processo político que pôs fim à ditadura foi de tal qualidade que conseguimos resistir à degradação. Porém, quanto tempo há antes da débâcle?

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