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Quando vigorava o bipartidarismo imposto pelo regime civil/militar havia Arena e MDB. A Aliança Renovadora Nacional apoiava o governo e o Movimento Democrático Brasileiro fazia oposição. Eram as funções determinadas por lei. Os 180 graus do espectro ideológico foram comprimidos em dois gomos de 90 graus. O modelo exalava a simplicidade dos ignorantes que não enxergam as nuanças, não ouvem os semitons.

Em 1974, dez anos depois do coup d’État que começou com o apoio da população das grandes cidades, houve eleições para cargos legislativos e o MDB fez avalanche de votos na região desenvolvida do país, elegendo muitos senadores, deputados federais, estaduais e vereadores. A vitória da oposição teve o efeito de deslegitimar a luta armada que à época encontrava ressonância como forma de resistência à ditadura. Só os surdos à voz do povo preferiram o estampido dos fuzis ao som do voto na urna. Outra consequência foi lançar o governo às cordas porque, ainda majoritário, não tinha hegemonia para consolidar o projeto de poder e se dispôs a fazer o "diabo" para ganhar a eleição seguinte.

Em abril de 1977, pretextando sufocar motim de militares "linha dura", o presidente da República, com base no AI5, pôs o Congresso Nacional em recesso, reformou a Constituição e editou decretos-lei. O "Pacote de Abril". Um dos itens desse embrulho atendia à preocupação diante da perspectiva de derrota na eleição de 1978. Assim, alterou-se a quantidade de deputados federais por estado, estabelecendo-se piso e teto. O Acre foi fixado no mínimo de oito e São Paulo, no máximo de 70.

O Senado é a casa dos estados. A Câmara dos Deputados, a do povo. Em tese, a forma federativa está balanceada no Senado e o regime republicano, na Câmara. Assim, a quantidade de deputados deve ligar-se à demografia, não à federação. Geisel, argumentando compensar as assimetrias de representação política entre os estados grandes e os pequenos, distorceu o peso do voto, aumentando a quantidade de deputados federais oriundos dos grotões e diminuindo os de origem metropolitana. Esse casuísmo para não perder a eleição de 1978 continua vigente.

O governo, qualquer que seja, tem mais votos que as oposições na parcela do eleitorado que depende de benefícios estatais. A dependência determina a subordinação. A onda da vitória eleitoral nasce na megalópole e a rebentação ocorre nas regiões mais pobres. Novos governos começam com os votos das pessoas independentes do aparelho público e se tornam velhos agarrando-se aos votos dos mais dependentes. Por isso, parodiando Marx, insta haver "eleitorado de reserva", não para o capitalismo, mas para o governismo. Afinal, nos tempos medíocres, se hay gobierno, soy a favor!

A eleição de 2014 deu a sensação de dèjá vu, inclusive com a divisão do eleitorado em dois Brasis. Porém, a linha lambertiana não é geográfica, Norte contra Sul. O divisor continua igual àquele dos anos 70: o grau de dependência do eleitor em relação ao governo tem forte correlação com a decisão de voto.

É de se esperar que 2014 e 2018 não sejam réplicas de 1974 e 1978, no sentido de que a próxima eleição ocorra livre de casuísmos destinados a retardar o movimento da onda eleitoral, pois tudo passa, sempre passará, canta Lulu Santos.

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