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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Capturei foto na internet, para usar de fundo da tela, que me emociona continuamente: a Lua com manchinha que parece um Z feito pela espada do Zorro. Ao ampliar a imagem, percebe-se que é a sombra da Estação Espacial Internacional. Bom explicar que a nave orbita a Terra em altitude variável de 300 a 400 quilômetros. A Lua está a quase 400 mil km. Assim, as órbitas devem estar ajustadas para que a Estação fique entre o Sol e a Lua, livre do sombreamento da Terra. O resultado é mágico.

A exploração espacial já submergiu na escala dos interesses populares. A maioria dos habitantes do planeta nasceu depois da chegada à Lua. A excitação com as fotos de Plutão, feitas de pertinho, é esquisitice de aficionados que sonhavam em ser astronautas, mas acabaram barrigudos, com cerveja e churrasco aos domingos, na fronteira final da chácara em Piraquara.

O tom épico das narrações dos primórdios das viagens ao éter, como se dizia à época, soa quase abestalhado. Contudo, ainda há frisson quando o Capitão Kirk e Spock são teleportados para a nave Klingon e conversam auxiliados por computador que faz tradução instantânea. Não é experiência religiosa, revelação, assunção. É o prazer de sonhar com a possibilidade de fazer algo acontecer pelo poder do conhecimento, não por intervenção sobrenatural. Consegue-se viver sem a segurança dos deuses?

A exploração espacial já submergiu na escala dos interesses populares. A maioria dos habitantes do planeta nasceu depois da chegada à Lua

Havia respostas cabais. Se algo fosse relevante, estava nos livros sagrados de qualquer credo. Tudo o mais era irrelevante porque a palavra divina não se ocupara. Ninguém precisava se dedicar a experimentar, descobrir, confirmar fatos físicos, químicos, biológicos. Os clérigos sanavam as dúvidas. Porém, nenhum texto ou autoridade religiosa indicava a existência da América e da Oceania, relevantes per si. Se os navegadores ibéricos tivessem seguido a Bíblia, o Alcorão, o Veda, o Talmud e não a bússola, o mundo ainda não seria global.

Os dogmas religiosos mostraram suas limitações, dando ensejo ao reconhecimento da ignorância como regra e a sapiência, exceção. As respostas devem ser buscadas na observação, no experimento, e os enunciados são válidos enquanto os fatos os confirmarem. Nenhum conhecimento é absoluto, intocável, sagrado. Distingue-se saber de acreditar; o laboratório, da fé. É angustiante a incerteza contínua do método científico.

Não se queimam velas para René Descartes ou Francis Bacon rogando que eles iluminem o pesquisador que manuseia pipetas e cadinhos tentando entender bioquímica. Ninguém incorpora Isaac Newton e Leibniz para que continuem a discussão sobre cálculo diferencial e tragam respostas às novas indagações sobre partículas subatômicas. Não há rezas diárias com a cabeça dirigida ao Vale do Silício.

O encanto com as vitórias do método científico sobre a ignorância produziu desastres como o nazismo e o comunismo, que tinham a pretensão de cientificidade – aquele, calcado na biologia; este, na sociologia. A legitimação de um decorreria da natureza; a d’outro, de vetor sobre-humano que conduzia a história a seu desfecho coletivista. Jalecos, não batinas, eram as suas imagens icônicas.

O método científico propiciou a percepção de que se segue adiante sem saber aonde se está indo. Fina ironia.

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