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Imagem vale mais que mil palavras, mas se todos emudecerem, impossível saber o que pensaram. Por isso, à imagem, palavras. Na Gazeta, semana passada, noticiou-se – com fotografia – que o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, está fazendo o curso preparatório do Detran porque teve a carteira de motorista cassada em razão do excesso de multas de trânsito. Assim, para se reabilitar a dirigir carros, deve passar por duas semanas de aulas e uma prova escrita.

A foto estampada no jornal retrata situação absolutamente normal numa República normal. Nós estamos a caminho da normalização depois de século de governo formalmente republicano e materialmente aristocrático. O ministro na cadeira de estudante denota saúde da democracia. É certo, os sinais são contraditórios porque na mesma época os jornais noticiaram que outro ministro concentrou verbas na base eleitoral do filho que é deputado federal. Avanço numa direção, recuo na outra. Todavia, entre passos à frente e atrás, saímos da total opacidade e desgoverno, cujo ápice ocorreu sob as presidências de Sarney e Collor, para a existência de controle estatal sobre o sistema bancário, contabilidade pública exposta na internet, licitações em pregão eletrônico, lei de responsabilidade fiscal, moeda estável. De perto, ainda não somos normais. Complexos, díspares, contraditórios, quase esquizofrênicos.

Os estrangeiros estão nos vendo como os novos ricos do planeta. Samba, futebol, mulatas e café deixaram de ser os ícones do Brasil. Alimentos, minérios, roupas, músicas como a de Michel Teló, indústria, construção civil, petróleo. Além disso, mulher eleita presidente depois de ter militado na luta armada contra a ditadura, mais ou menos na linha da Michelle Bachelet. Para eles não somos mais uma esquisitice, lugar exótico no qual todos se vestem como Carmem Miranda. Alguns até exageram e vem para cá à cata de emprego ou oportunidades empresariais. Será que eles estão vendo algo que ainda não percebemos ou estão iludidos pelos sinais positivos e cegos para os negativos?

As macumbas, benzimentos, simpatias, instintos usados para governar estão dando espaço para atitude mais profissional. Até mesmo políticos messiânicos – pais dos pobres – sentiram o efeito da camisa de força das instituições em consolidação. Sim, a estrada a ser percorrida é enorme, mas existe trecho percorrido, já é possível olhar retrospectivamente e comparar a situação atual com o passado não muito distante.

A existência de multas de trânsito eletrônicas é parte do processo de republicanização das atividades estatais. As máquinas não sabem com quem estão falando ou multando. Para elas, todos são iguais perante a lei. A pontuação para os motoristas também não distingue entre poderosos e comuns. A cena do ministro atento às aulas para obter nova carteira de motorista é muito agradável: ela demonstra funcionamento impessoal das regras que igualam direitos e deveres de todos os cidadãos numa República.

Não basta cordialidade e alegria carnavalesca para fazer um grande país. A seriedade institucional, asseguradora de certezas e inflexibilidades legais, é condição essencial para o desenvolvimento.

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