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Aquiles, vencendo e mor­­rendo com o calcanhar perpassado pela flecha de Paris, o sedutor de Helena; sábios poéticos e peripatéticos, matemáticos, geômetras, médicos; colunas do Partenon replicadas na fachada da UFPR; proporção áurea de Afrodite; essa Grécia permanece viva no alicerce da cultura ocidental e as antíteses entre platônicos e aristotélicos continuam energizando o pensamento que foi capaz de construir armas do fim do mundo e democracias que deram alguma razão de vi­­ver ao mundo. Contudo, a Grécia que emergiu dos escombros do Império Otomano em 1830 e entrou para a União Europeia em 1981 não lega políticas públicas ao estilo de Péricles. Desa­­tenta à lição de Ulisses, a Grécia se deixou levar pelo canto da sereia do déficit público e, praticamente, soçobrou nos rochedos da dívida.

A condução tropical do orçamento público, com a despesa superando alegremente a receita em mais de 10% ao longo de vários anos, levou o Tesouro grego à falência. É primário que a alegria artificial será sucedida por tristeza real, muito aguda e com tendência a se tornar crônica. Euforia e depressão. Ocorre, para os economicamente deprimidos, todos os remédios são amargos. Mágicas químicas não turbinam a atividade econômica e fazem passar a sensação de fim de festa. Para os gregos, o Estado atuou como desarrumador da casa; o Estado ge­­rou, pela irresponsabilidade fiscal, ecocaos, não economos.

Depois de se sentir poderoso com o poder de compra do euro, o po­­­­vo está em grande nú­­mero nas ruas se manifestando contra o arrocho salarial dos funcionários públicos e aumento de tributos que virão inevitavelmente. A faixa com a foice e o martelo es­­tendida na Acrópole deu conotação arqueológica à mobilização. Reação esclerosada e violenta que causou mortes e está paralisando a atividade econômica, especialmente o turismo. Diante dela, o chefe de Estado chegou a falar em risco de ruptura da coesão social. Para quem vive do esplendor mítico do passado, fechar a visitação aos monumentos e espalhar o pânico nas ruas, afugentando os turistas, acelera a marcha rumo à pobreza.

Para impedir a insolvência da Grécia, a União Europeia e o Fun­­do Monetário Internacional em­­prestarão, ao longo de três anos, dinheiro equivalente a quatro vezes o custo da usina hidroelétrica de Belo Monte. Empresta­­do, não dado. Significa dizer, há condições a serem cumpridas para viabilizar a estabilidade econômica e garantir os credores. A condicionante mais importante é o superávit do Te­­souro a ser ob­­tido mediante a redução da despesa pú­­blica (funcionários, salários, aposentadorias, subsídios) e incremento da receita com o aumento dos impostos.

Releva lembrar que o dinheiro alocado para o em­­préstimo à Grécia é público; cada país membro da União Europeia retirou porção do seu orçamento para ceder aos gregos, e o caixa do FMI é composto de recursos dos Estados que o integram. A visão simplória de banqueiros gananciosos que se aproveitam do desespero alheio só serve para atiçar insanidades nas passeatas. O povo de outros países pagou tributos e esse dinheiro está sendo entregue aos gregos para que eles se recuperem da falência.

Vendo de longe a situação atual da Grécia, vem à memória a irresponsabilidade fiscal que adoeceu o Brasil por séculos. Apto a ser gigante, de fato era anão econômico porque os nossos políticos não tinham a menor preocupação com os efeitos da­­nosos da excessiva dívida pú­­bli­­ca. A Lei de Responsabili­­dade Fis­­cal completou dez anos e a economia me­­lhorou muito nesse período breve. É prudente ce­­der ao encanto do déficit pú­­bli­­co? Mirem-se no mau exemplo das finanças de Atenas que fruíram das falenas e agora, fim da noitada, aos pedaços, borboleteiam ao regaço da Europa serena.

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