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De janeiro a agosto deste ano, o Inpe detectou 32,6 mil focos de incêndio no país, 61% a mais que no ano passado. A seca é culpada como diz meu amigo, o especialista Alberto Setzer?

Não há incêndio espontâneo. Há sempre um burro para começá-lo. Perdoem a franqueza, mas não há eufemismo possível quando o mal comum converge com o prejuízo individual.

O fogo libera rapidamente a energia contida em folhas e ramos e, sendo tão rápida, esta energia é dissipada. Ao deixar resíduos se degradarem naturalmente, eles alimentam minhocas, besouros e uma rica fauna do solo que, quando morrer, irá alimentar micro-organismos. Queimando de uma vez, quase tudo termina no rio. Degradando aos poucos, tudo é aproveitado, trazendo benefícios tanto para o agricultor como para todos. E, quando falo todos, digo também o planeta. O gás carbônico que emana da queima de biomassa, a principal contribuição brasileira para o efeito estufa, poderia estar no solo na forma de matéria orgânica, benéfica tanto para habitats como para a agricultura.

A seca somente amplia o resultado da burrice de atear fogo, mas não o causa diretamente. Em anos mais úmidos ateamos fogo da mesma forma, só que ele não se alastra tanto. Ao contrário, ao destruirmos biomassa, destruímos junto a capacidade de colocar umidade no ar. Não seria a queima que provoca a seca? Ao menos em escala local?

Mas, sem fogo, como reformaremos pastagens e colheremos a cana? Há hoje tecnologias de trituração de biomassa, onde o pasto velho é triturado, em vez de ser queimado, formando uma densa camada de folhas e ramos no chão, que protege e alimenta o solo. No caso da cana, a mecanização trouxe a possibilidade de colher a chamada "cana crua". Todas aquelas folhas, em vez de serem queimadas, passam a ser matéria orgânica do solo, com ganhos de produtividade e também atrasando o replantio, que é ao mesmo tempo uma operação cara e consumidora de muitos recursos naturais.

Já ouvi a bobagem de que fogo não pode ser assim tão ruim porque, afinal, era usado pelos índios. A coivara indígena era feita em áreas muito pequenas e cercadas por florestas. Ela conseguia usar o pulso de nutrientes que a cinza leva ao solo, sem os danos associados ao fogo em larga escala. E, depois de queimar um trecho pequeno, a mata era conduzida de novo à sua condição original. Nossos antepassados olharam esta tecnologia complexa (e provavelmente já perdida) de uso da floresta e a entenderam simplesmente como fogo!

Se alguém conhecer um adjetivo melhor que burro, por favor entre em contato.

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