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| Foto: Sergio Amaral/STJ

Para dirimir as dúvidas a respeito da confusão jurídica criada pelo desembargador Rogério Favreto, que concedeu um habeas corpus a Lula enquanto estava no plantão do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, a presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Laurita Vaz, não economizou nas palavras ao deixar claro que toda a responsabilidade pelo episódio foi do plantonista, que agiu fora de sua competência.

Laurita Vaz teve de analisar um novo habeas corpus, desta vez impetrado por um advogado que não faz parte da defesa de Lula, e que contestava a decisão do presidente do TRF-4, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, que na noite de domingo havia decidido que Lula ficaria preso e que o processo deveria ser remetido ao relator da Lava Jato na corte, João Pedro Gebran Neto. A presidente do STJ negou o novo habeas corpus e aproveitou a ocasião para fazer uma avaliação sobre as ações de todos os magistrados que protagonizaram o episódio do domingo.

A ministra disse ter estranhado que os deputados petistas Wadih Damous, Paulo Teixeira e Paulo Pimenta tenham impetrado o habeas corpus no TRF4 durante o plantão: “Depois de percorrer todas as instâncias do Poder Judiciário brasileiro, a questão sobre a prisão do ora Paciente foi ressuscitada por advogados, que, ainda inconformados, peticionaram, estranhamente, perante determinado juízo de plantão do TRF da 4.ª Região”, escreveu. De fato, os tribunais superiores seriam a instância adequada para se contestar a decisão da 8.ª Turma do TRF-4, já que o processo do tríplex tinha se encerrado naquela corte.

Toda a responsabilidade pelo episódio foi do plantonista, que agiu fora de sua competência

Mas Favreto, em vez de rejeitar o recurso, deu-lhe seguimento e concedeu a liminar, e por isso se tornou merecedor dos termos mais veementes usados por Laurita Vaz. O desembargador causou um “tumulto processual sem precedentes na história do direito brasileiro” com uma decisão “inusitada e teratológica” – em outras palavras, um absurdo, uma aberração, um “flagrante desrespeito à decisão colegiada da 8.ª Turma do TRF da 4.ª Região, ratificada pela 5.ª Turma do STJ e pelo Plenário do STF”.

Laurita Vaz rechaçou não apenas a competência de Favreto para decidir sobre algo que já tinha sido discutido no TRF-4, no STJ e no STF, mas também o argumento usado pelos petistas (e aceito por Favreto) no habeas corpus. “Causa perplexidade e intolerável insegurança jurídica decisão tomada de inopino, por autoridade manifestamente incompetente, em situação precária de plantão judiciário, forçando a reabertura de discussão encerrada em instâncias superiores, por meio de insustentável premissa”, escreveu. Referindo-se especificamente ao tal “fato novo” da pré-candidatura de Lula, a presidente do STJ acrescentou: “É óbvio e ululante que o mero anúncio de intenção de réu preso de ser candidato a cargo público não tem o condão de reabrir a discussão acerca da legalidade do encarceramento, mormente quando, como no caso, a questão já foi examinada e decidida em todas as instâncias do Poder Judiciário”.

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A presidente da corte não se limitou a repreender Favreto, mas ainda endossou a atitude dos outros protagonistas, o juiz federal Sergio Moro e os desembargadores Gebran Neto e Flores Lenz. Ao consultar o presidente do TRF-4 antes de cumprir a decisão de Favreto – que, lembre-se, havia citado Moro em sua decisão –, o juiz federal agiu “com oportuna precaução” diante de uma “esdrúxula situação processual”. Gebran Neto também acertou ao chamar o caso para si “diante da impossibilidade material de se levar o questionamento diretamente ao juízo natural da causa, no caso, a 8.ª Turma”. E Flores Lenz foi importante para resolver a controvérsia ainda no domingo, pois Favreto, com seguidas decisões insistindo no habeas corpus, jogava lenha na fogueira. As paixões inflamadas complicaram o cenário, “carecendo, por isso, de medida saneadora urgente”, nas palavras de Laurita. A presidente do STJ resume a ação de Moro, Gebran Neto e Flores Lenz afirmando que “as medidas impugnadas no presente habeas corpus (...) não constituíram nulidade, ao contrário, foram absolutamente necessárias para chamar o feito à ordem, impedindo que juízo manifestamente incompetente (o plantonista) decidisse sobre questão já levada ao STJ e ao STF”. Mais claro que isso, impossível.

O Conselho Nacional de Justiça ainda investigará as atitudes de Favreto, Moro e Gebran Neto naquele domingo emblemático, e pode até ter uma avaliação contrária à de Laurita Vaz em relação aos magistrados que se esforçaram para manter em vigor uma decisão colegiada respaldada por dois tribunais superiores. Mas fica cada vez mais difícil negar que, mesmo na hipótese (ainda mais improvável, após as palavras da presidente do STJ) de terem desrespeitado algum dispositivo legal, Moro e Gebran o fizeram após uma avaliação cautelosa do momento e da necessidade, movidos unicamente pelo senso de urgência em restaurar a ordem e a justiça, diante de uma decisão ilegal e absurda.

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