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O Congresso Nacional começa a levantar a tampa de mais uma caixa de Pandora com a criação, na última quarta-feira, da CPMI dos Sanguessugas. Sua tarefa será a de apurar o que já foi apurado pela Polícia Federal e de aprofundar as investigações que já estão sendo aprofundadas pelo Ministério Público. Mas não faz mal: apesar da sinonímia, quanto mais se apurar e se investigar, melhor. Dessa forma, teoricamente reduzem-se as chances, ainda que mínimas, de que acabem impunes os responsáveis pelos malfeitos com dinheiro público.

Sanguessugas é como foram apropriadamente designados os empresários, os funcionários públicos, os deputados e os senadores que, devidamente mancomunados, de um lado aprovavam emendas ao Orçamento da União e de outro, liberavam as verbas para compra superfaturada de ambulâncias depenadas para prefeituras municipais. Do lucro desonesto dos empresários saíam propinas para os demais. Estima-se que a maracutaia fez sobrar prejuízo da ordem de R$ 110 milhões para o erário. Meia centena de envolvidos já foi parar atrás das grades, incluindo alguns ex-parlamentares. Dezesseis atuais deputados também já estão sendo processados, mas suspeita-se que pelo menos outros cem tenham igualmente participado do esquema.

A nova CPMI já nasce sob as sombras lançadas pela Copa do Mundo e vai se desenrolar exatamente no período de campanha eleitoral, durante o qual o parlamento decreta o conhecido "recesso branco" – quando quase ninguém comparece para trabalhar em Brasília, preferindo cabalar votos em seus longínquos redutos. Desse modo, a expectativa é de que suas sessões rendam mais holofotes do que fatos novos.

Nasce também a nova CPMI sob o estigma do semifracasso das que lhe antecederam nos últimos tempos. A do Mensalão, por exemplo, terminou sem sequer aprovar um relatório final. A dos Bingos, ainda não concluída, promoveu muita marola, mas a principal herança que deixará tende a ser apenas a recomendação para que o jogo seja oficializado no Brasil. A dos Correios fez um bom trabalho e foi até capaz de convencer o Ministério Público a identificar no seu relatório a existência de uma "quadrilha criminosa" agindo nas entranhas do governo.

O estigma maior que emerge de todo esse barulho, no entanto, é a sensação de que ficarão impunes os indiciados. A própria Câmara Federal tratou de absolver a maioria dos mais notórios mensaleiros. Da Justiça, lenta e submetida a uma legislação processual que costuma favorecer a delinqüência, deve-se também esperar muito pouco. E do eleitorado, descrente, mal-informado e/ou manipulado, a reeleição dos maus políticos.

Apesar do clima tão pouco propício, apesar do descrédito, apesar do pessimismo que a cerca, que seja muito bem-vinda a CPMI dos Sanguessugas. Quem sabe, por obra providencial, seja esta comissão capaz de despertar a consciência popular de forma a não dar razão ao desalento que, na última quarta-feira, o senador amazonense Jefferson Peres manifestou da tribuna: "Que país é este?", perguntou ele, decepcionado com esta visão: o povo brasileiro tem tanta energia para se mobilizar para a Copa do Mundo, mas não demonstra a mesma disposição para reagir à corrupção e aos desmandos.

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